Wanderley Campos de Oliveira

DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL – UMA QUESTÃO SOCIAL

 

 Monografia apresentada à União Educacional de Minas Gerais,

como parte das exigências para obtenção do título de Especialista em Gestão Ambiental. 

Monografia defendida e aprovada em 12/04/2003

 Uberlândia – MG

União Educacional de Minas Gerais

2003

A consciência ecológica levanta-nos

um problema duma profundidade e duma

vastidão extraordinárias. Temos de defrontar

 ao mesmo tempo o problema da vida no

 planeta terra, o problema da sociedade

moderna e o problema do destino do homem.

Isto nos obriga a repor em questão a

própria orientação da civilização ocidental.

 Na aurora do terceiro milênio, é preciso

compreender que revolucionar, desenvolver,

Inventar, sobreviver, viver, morrer, anda

tudo inseparavelmente ligado.

                                                                                                 Edgar Morin, in Lago e Pádua, 1994, p.6 

 CAPÍTULO I

 INTRODUÇÃO

 Esta pesquisa originou-se das preocupações que a população brasileira passou, quando vivenciou um dos momentos de insegurança em relação a falta de energia elétrica, que levou todos a conviver com o fatídico “apagão”. Isso, com certeza, deixou em todos um sentimento de insegurança, pois a matriz energética do Brasil é caracterizada mundialmente como limpa pelo peso da energia renovável. Entretanto, as tendências nos últimos dez anos apontam para a falta de planejamento adequado do setor energético e a adoção de políticas regulatórias improvisadas. 

 

Diante disso, diversos projetos de construções hidrelétricas que estavam em “banho Maria” há mais de vinte anos entraram na pauta a fim de sanar ou amenizar o combalido sistema de energia elétrica no Brasil, falado, comentado, criticado e sem nenhuma alternativa dos órgãos governamentais.

 

Estes projetos também foram lembrados a partir do momento que se iniciou o processo de privatizações da energia elétrica no Brasil, com a finalidade de valorizar o sistema no momento da venda.

 

Porém, esqueceram de incluir na pauta de negociações e dos projetos civis, o projeto social, onde se destacaria os envolvidos nas áreas de entorno. Aliás, este procedimento já vinha sendo utilizado desde a primeira usina, onde os últimos a saberem que seriam os “afogados” proprietários da terra, responsáveis pelos minifúndios da agricultura artesanal sustentável e os últimos responsáveis ainda pela permanência do homem no campo.

 

As dezenas de usinas que se encontram no Brasil central, as chamados colar de tomadas, foram instaladas sem um projeto sócio-ambiental, onde o homem que deveria ser centro das discussões e não o último, haja vista que este problema se encerraria a partir do momento que recebesse a indenização pela terra, sem se preocupar com o destino que tomaria dali para frente.

 

A construção da usina de Miranda, por estar mais próxima de Uberlândia foi a que despertou maior interesse sobre os problemas sociais e ambientais ocasionados.

 

Na legislação vigente, tanto federal, estadual ou municipal não foram fiscalizados e respeitados os procedimentos, principalmente quanto a Lei de Uso e Ocupação dos Solos pela Prefeitura Municipal, em que pequenos loteamentos com objetivo de áreas de lazer de final de semana foram criados na área de entorno. Hoje, por diversas “pessoas” com poder de veto e mando possuírem suas chácaras nesta área, não há interesse de resolver o impacto social e ambiental instalado.

 

Obviamente, onde antes existia uma agricultura de subsistência familiar formada por pequenos proprietários, passou a ser área alagada e sem o retorno econômico, social e de subsistência.

 

Os problemas sociais criados, mais de cem famílias pobres vivem e residem a 1.000 metros da área de entorno, onde o acesso a água do lago se faz em apenas um local de 6 metros de largura.

 

Projetos de urbanização e infra-estrutura que deveriam fazer parte do projeto de vendas pelas imobiliárias e fiscalizados pela Prefeitura Municipal, são solicitados pelos moradores pobres, mas, a Prefeitura nada pode fazer no momento a não ser medidas paliativas. Mesmo se houvesse vontade política na alteração da Lei 245 de 30/11/2000 (Lei de Uso e Ocupação dos Solos) não haveria receitas orçamentárias destinadas, em função de que dezenas de famílias em Uberlândia não são privilegiadas em projetos urbanísticos.

 

No projeto inicial de Capim Branco conservaram a famigerada imposição ditatorial, onde o homem não está inserido na questão social e os agentes políticos estão mais preocupados em resolver o aspecto financeiro do município, deixando o proprietário da terra exposto apenas na questão indenizatória, sem se preocupar com o impacto sócio-ambiental, gerando novamente a experiência impactante de outras épocas recentes.

 

O estudo e a avaliação destes casos nos levaram a refletir o que poderá acontecer com o projeto Capim Branco, obviamente repetindo-se as experiências passadas, ou seja, mais uma vez o homem ficará de fora da questão social, migrando com familiares e empregados para os centros urbanos, aumentando a demanda de desempregados e miseráveis e passando a fazer parte das estatísticas camufladas dos órgãos de governo, que as usam para sensibilizar a sociedade. Assim, foi construído o objeto deste estudo: um estudo qualitativo que tenta verificar qual o impacto social que poderá ocasionar ao proprietário rural, quando da retirada do seu habitat para dar lugar aos lagos das hidroelétricas de Capim Branco I e Capim Branco II, ocasionando a sua desagregação familiar provocada pela mudança brusca de cultura. Este trabalho, portanto, teve como foco principal a relação entre Desenvolvimento Sustentável, Impacto Social e Reassentamento Populacional.

Diante do exposto, definiram-se os seguintes objetivos:

a) Verificar as expectativas do homem que terá suas terras inundadas pelos lagos, quando de sua retirada de seu habitat.

b)   Detectar e acompanhar qual a participação das organizações governamentais e não governamentais em relação a mitigação dos impactos sociais afetados pelo empreendimento.

c)  Conhecer e analisar as estratégias propostas pelo consórcio Capim Branco I e II em relação às medidas compensatórias do resultado impactante.

 Este trabalho será apresentado em cinco capítulos.

O Capítulo II busca, através da revisão da literatura sobre os diferentes conceitos de desenvolvimento sustentável, evidenciar as concepções que nortearam os grandes encontros responsáveis pela conscientização e preservação do meio ambiente mostrando que os fatores impactantes devem ser mais bem discutidos com a população e com os governantes no sentido de pensar a nova realidade que se apresenta como mistério e desafio e lançar as bases para a construção de um Planeta mais saudável e seguro para as gerações futuras.

 

O Capítulo III apresenta o referencial teórico sobre os avanços e perspectivas do desenvolvimento sustentável no Brasil após o Congresso Rio-92, demonstrando que o desenvolvimento sustentável no Brasil é vibrante e crescente. A sociedade brasileira está cada vez mais consciente da premência de lidar com os efeitos negativos da degradação ambiental na qualidade de vida das gerações atuais e futuras e da necessidade urgente de elaborar novos modelos para o desenvolvimento, que promovam eqüidade, justiça social e manejo ambiental bem fundado.

 

No Capítulo IV encontra-se a caracterização da região e da área de estudo no sentido de melhor contextualizar o problema proposto nesta pesquisa.

 

Os capítulos V e VI se constituem do relato da pesquisa e de seus resultados.

Finalmente, no Capítulo VII, estão reunidas as discussões e descobertas proporcionadas pelos dois estudos propostos nesta pesquisa: o Estudo 1 visava pesquisar,  através da mídia impressa, os aspectos geradores de preocupações atribuídos pelos diferentes segmentos da sociedade de Uberlândia a respeito da construção das hidrelétricas Capim Branco I e Capim Branco II. O Estudo 2 objetivou verificar as expectativas do homem que terá suas terras inundadas pelos lagos, quando da retirada de seu habitat.

 

CAPÍTULO II

DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL 

            A expressão “desenvolvimento sustentável” entra em circulação a partir dos debates mundiais sobre como conciliar atividade econômica e conservação do meio ambiente, no início da década de 80. Por mais que o discurso predominante fosse o de que desenvolvimento e meio ambiente não são incompatíveis, tese vencedora na conferência da ONU em Estocolmo, em 1972, na verdade, nas palavras de ALMEIDA (2002 p. 53), ninguém estava muito certo de como essa compatibilidade se traduziria na prática.

 

            O crescente conhecimento científico do funcionamento dos ecossistemas e de toda a sua magnífica complexidade desafiava o modelo conceitual de mundo. Acostumado a dividir o universo em compartimentos estanques para poder entendê-lo numa visão ainda cartesiana, mecanicista, reducionista, reflexos ainda da Revolução Científica e Industrial, nos últimos anos do século XX o homem viu-se às voltas com a constatação de que a natureza não se deixa apreender completamente pelas ferramentas tradicionais de análise. Ela é sistêmica, complexa e não-linear, por isso não funciona como a soma das partes que a compõem, mas como o produto da inter-relação das partes. Segundo ALMEIDA (2002 p. 54), para ser compreendida, pede um novo paradigma: orgânico, holístico e integrador.

 

            Por isso, quando foi colocada a questão sobre como conciliar a atividade econômica com a conservação dos sistemas ambientais embute aí uma compartimentação das coisas do mundo – economia X ecologia – traindo assim a presença do modelo conceitual tradicional e parece conduzir ao impasse. Assim, quando na década de 1980 começou uma vanguarda de cientistas, religiosos, economistas, filósofos e políticos, já percebia que era preciso formular uma nova síntese.

 

            A ciência chamava atenção para problemas como o aquecimento global, a destruição da camada de ozônio, a chuva ácida e a desertificação. É nesse momento que entra em cena a Comissão Brundtland, presidida pela ex-primeira ministra da Noruega Gro Harlem Brundtland, e da qual também fazia parte o brasileiro Paulo Nogueira Neto, então titular da Secretaria Especial do Meio Ambiente (SEMA). Formalmente batizada de Comissão Mundial sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, foi criada pela ONU, em dezembro de 1983, para estudar e propor uma agenda global com objetivos de capacitar a humanidade para enfrentar os principais problemas ambientais do planeta e assegurar o progresso humano sem comprometer os recursos para as futuras gerações.

 

            A partir do relatório da Comissão Brundtland que foi posto em circulação a expressão “desenvolvimento sustentável”. De acordo com Paulo Nogueira Neto, citado por ALMEIDA (2002, p. 55), “ninguém lembra quem a usou primeiro”, mas certamente foi o marco para que a gestão ambiental começasse a evoluir para a gestão da sustentabilidade.

 

            O que se evidenciou através dos estudos pesquisados para a comissão construir o conceito de desenvolvimento sustentável, recorreu à noção de capital ambiental. Para isso, denunciou a dilapidação dos recursos ambientais do planeta por seus habitantes atuais às custas dos interesses de seus descendentes.

 

            Dessa forma, Almeida ao analisar o relatório da Comissão, em relação ao conceito coloca que: 

“Muitos dos atuais esforços para manter o progresso humano, para atender às necessidades humanas e para realizar as ambições humanas são simplesmente insustentáveis – tanto as nações ricas quanto nas pobres. Elas retiram demais, e a um ritmo acelerado demais, de uma conta de recursos ambientais já a descoberto, e no futuro não poderão esperar outra coisa que não a insolvência dessa conta. Podem apresentar lucro nos balancetes da geração atual, mas nossos filhos herdarão os prejuízos. Tomamos um capital ambiental emprestado às gerações futuras, sem qualquer intenção ou perspectiva de devolvê-lo (2002, p. 56)”.  

 

             Assim, desenvolvimento sustentável, de acordo com o relatório da Comissão Mundial sobre Meio Ambiente, seria aquele que “satisfaz as necessidades do presente sem comprometer a capacidade de as futuras gerações satisfazerem suas próprias necessidades” (1988, p.3).

 

            Muitas foram as críticas feitas a esse conceito posteriormente, para GADOTTI (2000), talvez pelo seu uso reducionista e sua trivialização, apesar de aparecer como “politicamente correto” e “moralmente nobre”. Para ele, as críticas ao conceito de desenvolvimento sustentável e à própria idéia de sustentabilidade vêm do fato de que ambientalismo trata separadamente as questões sociais das ambientais. O movimento conservacionista surgiu como uma tentativa elitista dos países ricos no sentido de reservar grandes áreas naturais preservadas para o seu lazer e contemplação. A Amazônia, por exemplo. Não era uma preocupação com a sustentabilidade do planeta, mas com a continuidade dos seus privilégios, em contraste com a necessidade da maioria da população. Para o biólogo e paleontólogo norte-americano Stephen Jay Gould, “nunca conseguimos nos livrar inteiramente desta visão do ambientalismo como algo oposto às necessidades humanas imediatas, especialmente as necessidades dos pobres e desafortunados” (O Estado de S. Paulo, p. 4, 6 jun.,1993).

 

            Por isso, o sucesso da luta ecológica depende muito da capacidade de os ecologistas convencerem a maioria da população mais pobre, de que se trata não apenas de limpar os rios, despoluir o ar, reflorestar os campos devastados para vivermos num planeta melhor num futuro distante. GADOTTI (2000), chama a atenção, que é necessário dar uma solução urgente e simultaneamente, aos problemas ambientais e aos problemas sociais. Para ele os problemas de que trata a ecologia não afetam apenas o meio ambiente, afetam o ser mais complexo da natureza, que é o ser humano. Reforçando esta posição, Leonardo Boff explicita através de uma feliz frase “queremos uma justiça social que combine com a justiça ecológica. Uma não existe sem a outra” (O Estado de São Paulo, p. 2, 6 jun., 1993).  Pois, os mais ameaçados pela destruição do planeta são os pobres.

 

             ALTVATER considera a teoria do “desenvolvimento sustentável” do Relatório Brundtland – “um desenvolvimento que satisfaz as necessidades do presente sem colocar em risco a possibilidade de satisfação das necessidades das gerações futuras” – “uma fórmula vazia” (1995, p. 282), pois ela supõe uma “solidariedade sincrônica e diacrônica entre as pessoas e entre as sociedades {...}. Naturalmente, este princípio implica um distanciamento em relação ao princípio do lucro e, portanto, também a situação de não precisar respeitar as restrições {monetárias} externas. Contudo, esta questão é deixada de lado no debate sobre um desenvolvimento sustentável: as pessoas fazem de conta que seria possível erigir, no plano nacional, uma economia que poupa o meio ambiente, é eficiente e voltada para o futuro, e que, simultaneamente, corresponda às restrições orçamentárias do fordismo internacional” (idem, p. 282-3). ALTVATER (1995) concorda que o desenvolvimento “deve ser economicamente eficiente, ecologicamente suportável, politicamente democrático e socialmente justo”, mas não vê como isso pode ser feito sob o modo de produção fordista, intrinsecamente insustentável. Essa é a maior contradição da proposta do desenvolvimento sustentável: a idéia normativa da qualidade de ser sustentável é destruída pela análise das restrições {externas} de uma moderna sociedade capitalista industrial.

 

            Dessa forma, a organização de estruturas econômicas e sociais coerentes permite ser sustentável apenas de modo condicional, isso somente enquanto não se colide com as restrições sistêmicas externas, sobretudo o princípio do lucro, a competitividade, a imposição das condições objetivas. Ainda segundo ALTVATER (1995), a conclusão é simples e realista. “Ser sustentável constitui norma digna de ser efetivada, mas que só pode converter em realidade na medida em que as instituições básicas da sociedade não sejam consideradas sacrossantas. Isto se refere naturalmente também às instituições da nova (des)ordem mundial” (p.295-6).

 

            Assim sendo, ALTVATER ressalta em sua proposta que “ecologizar a economia” objetiva questionar as bases desse consagrado modelo econômico que ele considera “evangelicano” (evangélico + americano), no interior do qual eficácia econômica e justiça distributiva seriam o mesmo que a “quadratura do círculo”, ou seja, o sonho de um capitalismo ecológico é insustentável (1995, p.304-5).

 

            O conceito de “desenvolvimento sustentável” não é um conceito neutro, segundo GADOTTI (2000), ele tem um contexto bem preciso dentro de uma ideologia do progresso, que supõe uma concepção de história, de economia, de sociedade e do próprio ser humano. Isso, ainda de acordo com o autor, o conceito foi utilizado numa visão colonizadora, durante muitos anos, na qual os países do globo foram divididos entre “desenvolvidos”, “em desenvolvimento” e “subdesenvolvidos”, remetendo-se sempre a um padrão de industrialização e de consumo. Logo supõe que todas as sociedades devam orientar-se por uma única via de acesso ao bem-estar e à felicidade, a serem alcançados apenas pela acumulação de bens materiais.

 

            Para tanto, metas de desenvolvimento foram impostas pelas políticas econômicas neocolonialistas dos países chamados “desenvolvidos”, em muitos casos com enorme aumento da miséria, da violência e do desemprego. Junto com esse modelo econômico, com ajustes por vezes criminosos, foram transplantados valores éticos e ideais políticos que levaram à desestruturação de povos e nações.

 

             Portanto, não é de se estranhar que muitos tenham reservas quando se fala em desenvolvimento sustentável. Morin ilustra bem esse quadro ao colocar que               

“O mito do desenvolvimento determinou o crescimento em função do qual tudo foi sacrificado. Permitiu justificar ditaduras impiedosas, seja do modelo ‘socialista’ do partido único, seja do modelo pró-ocidental militar. As crueldades da revolução do desenvolvimento agravaram as tragédias do subdesenvolvimento {...} A idéia desenvolvimentista foi e continua sendo cega às riquezas culturais das sociedades tradicionais que não foram vistas a ser através de óculos economistas e quantitativos {...} Fruto de uma racionalização ocidental céntrica, o desenvolvimento foi, da mesma maneira, cego ao fato de que as culturas de nossas sociedades desenvolvidas comportam nelas, como em todas as culturas, mas de maneiras diferentes, ao lado de verdades e de virtudes profundas, idéias arbitrárias, mitos não fundados, enormes ilusões e cegueiras terrificantes (1993, p. 90)”.

              MORRAN (1993), conclui dizendo que “toda evolução comporta abandono, toda criação comporta destruição, todo ganho histórico paga-se com uma perda” (p.93).

            Portanto, o preço que a humanidade terá que pagar pelo desenvolvimento econômico não será pouco. GADOTTI (2000) expressa sua preocupação ao dizer que:

 “com certeza, temos hoje a consciência de uma iminente catástrofe se não traduzirmos essa consciência em atos para retirar do desenvolvimento essa visão predatória, conceber o nosso planeta de forma mais antropológica e menos economicista, e assim salvar a Terra (p.60)”.

Para Francisco Gutiérrez, citado por GADOTTI (2000), parece impossível construir um desenvolvimento sustentável sem que haja uma educação para isto. Para ele, o desenvolvimento sustentável requer quatro condições básicas. Ele deve ser: economicamente factível; ecologicamente apropriado; socialmente justo e, culturalmente eqüitativo, respeitoso e sem discriminação de gênero.

 

Essas condições do desenvolvimento sustentável são suficientemente claras e auto-explicativas. O desenvolvimento sustentável, mais do que um conceito científico é uma idéia-força, uma idéia mobilizadora neste início de século.

 

Alguns estudiosos fazem observações que demonstram a importância do conceito sobre desenvolvimento sustentável, bem como a sua contribuição para o planeta. “Apesar das críticas a que tem sido sujeito, o conceito de desenvolvimento sustentável representa um importante avanço na medida em que a Agenda 21 global, como plano abrangente de ação para o desenvolvimento sustentável neste século, considera a complexa relação entre desenvolvimento e meio ambiente numa variedade de áreas (JACOBI, 1999, p. 18)”. Conforme Juha Sipilä, diretor do Conselho Metropolitano de Helsinque, “desenvolvimento sustentável significa usarmos nossa ilimitada capacidade de pensar em vez de nossos limitados recursos naturais” (KRANZ, 1995, p. 8). Para BOFF (1999, p. 198), “uma sociedade ou um processo de desenvolvimento possui sustentabilidade quando por ele se consegue a satisfação das necessidades, sem comprometer o capital natural e sem lesar o direito das gerações futuras de verem atendidas também as suas necessidades e de poderem herdar um planeta sadio com seus ecossistemas preservados”.

 

Por isso, se faz necessário uma compatibilidade das ações locais com as ações planetárias, tornando imprescindível a articulação com o poder público. As pessoas, a sociedade civil, em parceria com o Estado precisam dar sua parcela de contribuição para criar cidades e campos saudáveis, sustentáveis, isto é, com qualidade de vida. Qualidade de vida, para GADOTTI é

 

“um conceito distinto do conceito de ‘nível ou padrão de vida’. Fala-se de nível ou padrão para designar a satisfação de necessidades humanas, principalmente as necessidades econômicas. Qualidade de vida faz referência à satisfação do conjunto das necessidades humanas: saúde, moradia, alimentação, trabalho, educação, cultura, lazer. Qualidade de vida significa ter a possibilidade de decidir autonomamente sobre seu próprio destino (2000, p. 62)”.    

 

  GADOTTI, ao citar Francisco Gutiérrez, destaca que em seu livro Pedagogia para el Desarrollo Sostenible, denomina desenvolvimento sustentável como aquele que apresenta algumas características que se complementam entre elas numa dimensão mais holística e que apontam para novas formas de vida do “cidadão ambiental”:

·                    Promoção da vida para desenvolver o sentido da existência. Devemos partir de uma cosmovisão que vê a Terra como ‘único organismo vivo’. Entender com profundidade o planeta nessa perspectiva implica uma revisão de nossa própria cultura ocidental, fragmentária e reducionista, que considera a Terra um ser inanimado a ser ‘conquistado’ pelo homem.

·                    Equilíbrio dinâmico para desenvolver a sensibilidade social. Por equilíbrio dinâmico Gutiérrez entende a necessidade de o desenvolvimento econômico preservar os ecossistemas.

 ·                                         Congruência harmônica que desenvolve a ternura e o estranhamento (‘assombro’, capacidade de deslumbramento) e que significa sentir-nos como mais um ser – embora privilegiado – do planeta, convivendo com outros seres animados e inanimados. Segundo Gutiérrez, ‘na busca desta harmonia será preciso uma maior vibração e vinculação emocional com a Terra’ (1994, p. 19). {...}.

                        ·                   Ética integral, isto é, um conjunto de valores – consciência ecológica – que dá sentido ao equilíbrio dinâmico e à congruência harmônica e que desenvolve a capacidade de auto-realização.

                                           Racionalidade intuitiva que desenvolve a capacidade de atuar como um ser humano integral. A racionalidade técnica e instrumental que fundamenta o desenvolvimento desequilibrado e irracional da economia clássica precisa ser substituída por uma racionalidade emancipadora, intuitiva, que conhece os limites da lógica e não ignora a afetividade, a vida, a subjetividade.

                     ·                   Consciência planetária que desenvolve a solidariedade planetária. Um planeta vivo requer de nós uma consciência e uma cidadania planetária, isto é, reconhecermos que somos parte da Terra e que podemos viver com ela em harmonia – participando do seu devir – ou podemos perecer com a sua destruição (2000, p. 62 – 64) “.

 

Dessa forma, pode-se afirmar que essas também são características da “sociedade sustentável”, o que leva a concluir que não há “desenvolvimento sustentável” sem “sociedade sustentável”.

 

Portanto, não resta dúvida de que esta concepção do desenvolvimento coloca em evidência o consumismo do modo de produção capitalista, principal responsável pela degradação do meio ambiente e pelo esgotamento dos recursos materiais do planeta. Esse modelo de desenvolvimento, baseado no lucro e na exclusão social, não só distancia cada vez mais ricos e pobres, países desenvolvidos e subdesenvolvidos, globalizadores e globalizados. Isso porque, a existência de países ricos e pobres faz parte da própria lógica do sistema. A insustentabilidade do sistema econômico capitalista é parte intrínseca do seu modelo de desenvolvimento. O subdesenvolvimento não é uma fase anterior ao desenvolvimento. É um mito imperialista a idéia de que os países subdesenvolvidos devem imitar os países desenvolvidos para superarem o seu desenvolvimento.

 

De acordo com os estudos realizados por LIMA (1997), essas críticas levaram a formular um novo conceito: o ecodesenvolvimento, baseado nos seguintes princípios:

 

·         “a satisfação das necessidades básicas da população;

·         a solidariedade com as gerações futuras;

·         a participação da população envolvida;

·         a preservação dos recursos naturais e do meio ambiente em geral;

·         a elaboração de um sistema social que garanta emprego, segurança social e respeito a outras culturas; e

·         programas de educação (p. 210)”.

 

Maurice Strong, diretor-executivo do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA), utilizou, pela primeira vez, o termo

 

 “ecodesenvolvimento” em julho de 1973 para designar um tipo de desenvolvimento econômico e social em cuja planificação deve ser considerada a variável Meio Ambiente.

 

 Ainda segundo LIMA (idem p. 211), esse conceito

 

“enfatiza ainda sua oposição aos modelos de crescimento imitativos, à importação de tecnologias inadequadas e à promoção da autonomia das populações envolvidas, de forma a superar a dependência cultural dos referenciais externos. Caracteriza-se, enfim, como uma estratégia multidimensional e articulada de dinamização econômica, sensível à degradação ambiental e à marginalização social, cultural e política das populações consideradas”. 

E acrescenta: 

“o conceito de sustentabilidade inova também, ao valorizar os problemas das relações norte-sul e, sobretudo, as especificidades dos países pobres, quando relaciona pobreza, riqueza e degradação, quando atenta para as implicações adversas da dívida externa no contexto sócio-ambiental desses países, inclusive reconhecendo a desigualdade norte-sul e a maior responsabilidade relativa dos países do norte na construção de um desenvolvimento sustentável (idem, p. 213)”.

Entretanto, se analisar que os graves problemas sócio-ambientais e as críticas ao modelo de desenvolvimento foram gerando na sociedade maior consciência ecológica nas últimas décadas. Embora essa consciência não tenha ainda provocado mudanças significativas no modelo econômico e nos rumos das políticas governamentais, algumas experiências concretas apontam para uma crescente sociedade sustentável em marcha.

 

Dentro deste contexto analisado até aqui, poderia questionar qual é a situação do Brasil em relação ao “desenvolvimento sustentável” do planeta Terra? De acordo com VIANNA &VERONESE (1992),

 

 “ O Brasil, a partir da segunda metade do século passado, vem sofrendo grandes transformações em função do crescimento demográfico (sua população aumentou 2,7 vezes entre 1950 e 1970, passando 74,3% a viver em zonas urbanas) e da modernização de suas bases de desenvolvimento. De um estágio de economia predominantemente exportadora de produtos agrícolas passou a um estágio de industrialização considerável (crescimento de 9,3% a.a. da população industrial, no período de 1970 a 1990), com predominância de produtos manufaturados em sua pauta de exportações”.

 

Para ANDRADE (2000), esse acelerado ritmo de industrialização e concentração de contingentes populacionais em áreas urbanas passou a provocar profundos impactos no meio ambiente, tanto físicos como econômicos e sociais, promovendo a atividade industrial a fator determinante nas transformações ocorridas.

 

Diante disso, o governo brasileiro sentiu a necessidade de uma participação mais efetiva junto aos outros países do planeta no sentido de estabelecer ações que inibissem o processo ora estabelecido no país em relação aos impactos ambientais. E já como principal conseqüência de sua participação na Conferência de Estocolmo, que ressaltou a estreita vinculação entre desenvolvimento e seus efeitos sobre o meio ambiente, o governo brasileiro sentiu a necessidade e viu a oportunidade de institucionalizar autoridade em nível federal, orientada para a preservação ambiental do país. Em 30 de outubro de 1973 foi criada a Secretaria Especial de Meio Ambiente (SEMA). Tal iniciativa da área federal foi precedida pela criação da Companhia de Tecnologia de Saneamento Ambiental (Cetesb) (Lei nº 118, de 29 de junho de 1973), sendo logo em seguida instituído o Conselho Estadual de Proteção Ambiental (Cpram), na Bahia, em 4 de outubro de 1973.

 

A partir de 1975, órgãos ambientais foram sendo criados nos diversos Estados, e começaram a surgir legislações e regulamentações específicas de controle ambiental nos níveis federal, estadual e, posteriormente, municipal.

 

Ainda, de acordo com ANDRADE (2000), a organização ambiental das empresas no Brasil varia em função do tamanho e do tipo de indústria. Estas introduziram em suas rotinas as auditorias ambientais que se constituem em um dos mais importantes instrumentos de gestão ambiental, tendo como objetivo principal auxiliar no processo de melhoria dos programas de controle ambiental.

 

Os estudos sobre impacto ambiental passaram a ser uma exigência legal para implementação de unidades industriais e de outros empreendimentos, a partir da Resolução Conama 001, de 28 de fevereiro de 1986. 

 

Mas, a preservação do meio ambiente converteu-se em um dos fatores de maior influência somente a partir da década de 90, com grande rapidez de penetração de mercado. Assim, as empresas começam a apresentar soluções para alcançar o desenvolvimento sustentável e ao mesmo tempo aumentar a lucratividade de seus negócios.

 

No Brasil também, percebeu-se que os termos desenvolvimento e crescimento eram usados de forma indistinta. Segundo ANDRADE (2000), atualmente, crescimento econômico é entendido como crescimento contínuo do produto nacional em termos globais ao longo do tempo, enquanto desenvolvimento econômico representa não apenas o crescimento da produção nacional, mas a forma como esta é distribuída social e setorialmente. Assim, a proteção ambiental deslocou-se uma vez mais, deixando de ser uma função exclusiva de proteção para tornar-se também uma função da administração.

 

Dessa forma, a questão ambiental é contemplada na estrutura organizacional e interfere no planejamento estratégico, passou a ser uma atividade importante na empresa, seja no desenvolvimento das atividades de rotina, seja na discussão dos cenários alternativos, e a conseqüente análise de sua evolução acabou gerando políticas, metas e planos de ação.           

“Esse novo pensamento precisa ser acompanhado por uma mudança de valores, passando da expansão para a conservação, da quantidade para a qualidade, da dominação para a parceria. O novo pensamento e o novo sistema de valores , juntamente com as correspondentes percepções e práticas novas, constituem o que denominamos de ‘novo paradigma (ANDRADE, 2000, p.11)”. 

Para o mesmo autor, o novo paradigma pode ser descrito como uma visão holística do mundo, ou seja, a visão do mundo como um todo integrado e não como um conjunto de partes dissociadas. Assim, o gerenciamento ecológico envolve a passagem do pensamento mecanicista para o pensamento sistêmico. Um aspecto essencial dessa mudança é que a percepção do mundo como máquina cede lugar à percepção do mundo como sistema vivo. Essa mudança representa a concepção que se tem da natureza, do homem, da sociedade e, portanto, também da percepção de uma organização de negócios.

 

Assim sendo, as empresas devem ser percebidas como sistemas vivos cuja compreensão não se faz apenas pelo aspecto econômico, mas também, por uma administração que prevê em seu planejamento estratégico a preservação ambiental da empresa. Para isso, as ações a serem desenvolvidas pela empresa, necessariamente, devem partir de uma perspectiva ecológica profunda em que provoquem uma mudança de valores na cultura empresarial, isto é, da dominação para a parceria, da ideologia do crescimento econômico para a ideologia da sustentabilidade ecológica. 

CAPÍTULO III

DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL NO BRASIL PÓS-RIO–92: DESAFIOS E PERSPECTIVAS

As grandes expectativas geradas na Rio-92, provavelmente não foram atingidas, entretanto o movimento para o desenvolvimento sustentável e justiça ambiental no Brasil é vibrante e crescente. Percebe-se através de publicações da mídia impressa, falada e virtual e das homologações de legislações, que a sociedade brasileira está cada vez mais consciente da premência de lidar com os efeitos negativos da degradação ambiental na qualidade de vida das gerações atuais e futuras e da necessidade urgente de elaborar novos modelos para o desenvolvimento, que promovam eqüidade, justiça social e manejo ambiental bem fundado.

 

 A Rio-92 constitui-se num marco histórico nas discussões sobre a necessidade de implementação de um modelo de desenvolvimento ambiental e socialmente sustentável em escala planetária. Este debate repercutiu profundamente no Brasil, onde realizou a Conferência, inaugurando uma nova mentalidade e selando um compromisso nacional em favor do meio ambiente no cenário do processo de desenvolvimento que, periodicamente, precisa ser revisitado.

 

A Conferência reuniu 179 chefes de Estado e de Governo que firmaram o mais ambicioso programa de ações conjuntas com o objetivo de promover, em escala planetária, um novo estilo de desenvolvimento, o desenvolvimento sustentável e se fez acompanhar de uma inédita participação da sociedade civil através do Fórum das ONGs, cujo objetivo, naquele momento, era extrair claros compromissos políticos das grandes lideranças mundiais sobre temas de importância maior para o futuro do Planeta.

 

A Conferência Internacional sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável discutiu temas ambientais fundamentais em nível global, aos 20 anos da Conferência de Estocolmo (1972).

 

A Declaração do Rio, reafirmando a Declaração de Estocolmo e buscando basear-se nela, reconhece “a natureza integral e interdependente da Terra observando o estabelecimento de acordos internacionais que respeitem os interesses de todos e protejam a integridade do meio ambiente global e o sistema de desenvolvimento, teve como objetivo estabelecer uma nova e justa parceria global através da criação de novos níveis de cooperação entre os Estados e setores importantes da sociedade”.

 

Nas resoluções da Agenda 21, documento oriundo dessa Conferência, se incorpora e reconhece a necessidade de considerar as questões educacionais como fundamentais para a preservação dos recursos naturais e criar uma nova ética ambiental do desenvolvimento.

 

A Agenda 21 é, provavelmente, o mais importante resultado da Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento Humano, realizada em junho de 1992 no Rio de Janeiro, Brasil.

 

O desenvolvimento sustentável é uma modalidade do desenvolvimento que pretende conciliar as diversas lógicas econômico-sociais com os processos de sustentabilidade ecológica, objetivando a conservação e preservação dos recursos naturais renováveis e não-renováveis e a melhoria da qualidade de vida da população do mundo. A Agenda 21 propõe ser o texto-chave para guiar governos e sociedades nas próximas décadas rumo ao estabelecimento de um novo modelo de desenvolvimento.

 

Ainda que o foco deste documento seja o mundo em desenvolvimento, a Agenda 21 prevê uma pauta de ações altamente relevante para os países considerados “desenvolvidos”, seja recomendando mudanças nos padrões de consumo e na adoção de processos que queiram reorientar a produção econômica, seja co-responsabilizando estes mesmos países pelas políticas e ações de controle da chamada “crise ambiental global”.

 

Está explícito o papel que os países desenvolvidos deverão cumprir tanto como financiadores de parte dos custos do novo modelo, quanto promotores do intercâmbio de conhecimento e tecnologias de suporte aos países em desenvolvimento.

 

Com a diferença de outros documentos gerados em conferências semelhantes, a Agenda 21 não é somente uma declaração de princípios e intenções. Possui a forma de um guia, sugerindo ações, atores, metodologias para a obtenção de consensos, mecanismos institucionais para implementação e monitoramento de programas, estimando seus custos.

 

É interessante destacar que na Conferência de Estocolmo as grandes questões ambientais em pauta faziam referência aos “recursos naturais não renováveis”, como o petróleo, por exemplo. Passados 20 anos, a Conferência do Rio centralizou sua discussão em torno dos “recursos naturais renováveis”, como por exemplo, a biodiversidade, a preservação de florestas, entre outros. Um interessante exercício seria analisar o porquê desta nova ênfase.

 

Apesar dos esforços realizados por diferentes países, o texto da Agenda 21 continua sendo pouco conhecido. Somente nos últimos anos observa-se uma preocupação maior por parte dos governos para a elaboração das Agendas 21 nacionais e um impulso na elaboração das Agendas 21 locais.

 

O desconhecimento por parte da sociedade pode ser verificado, por exemplo, no Brasil, considerando que nas vésperas da Rio +5 (1997), reunião que avaliou os esforços realizados para a implementação dos compromissos da Rio-92, o Ministério do Meio Ambiente divulgou uma pesquisa nacional, coordenada por Samyra Crespo, intitulada “O que o brasileiro pensa do Meio Ambiente, do desenvolvimento e da sustentabilidade”. Esta pesquisa revelou que 95% da população brasileira jamais ouviu falar sobre a Agenda 21 e que apenas 42% tem alguma notícia do que resultou da Rio-92. A conclusão disso é que a primeira tarefa a ser efetuada é informar as pessoas do que trata o programa da Agenda, e em quais questões ele pode melhorar a qualidade de nossas vidas e a dos nossos descendentes.

 

Entretanto, é importante salientar que os documentos aprovados na Conferência  incorporaram-se às Resoluções das Nações Unidas, tornando sua execução imperativa mediante a adoção de legislações específicas nos países membros. Todos os documentos citados neste capítulo somados ao Protocolo de Florestas, Declaração do Rio de Janeiro e Carta da Terra, influenciaram profundamente a opinião pública mundial sendo, desde então, permanentemente avaliados (CAMARGO et al. 2002).

 

Para os autores, o fórum global de discussões que se tornou a Rio-92 estimulou especialmente o debate ambiental na sociedade brasileira, chamando a atenção da mídia, dos governos, dos empresários e da sociedade civil em geral. Não resta dúvida que, a partir daquele encontro, algo mudou. Novos compromissos de grande magnitude entraram na pauta das exigências, a serem cobradas no futuro.

 

Nos últimos dez anos ocorreram paralisias e retrocessos nos compromissos multilaterais, destacadamente no encaminhamento da convenção sobre mudanças climáticas. Da mesma forma, os avanços foram precários nas convenções sobre biodiversidade e desertificação, tendo em vista a carência de recursos e de meios de implementação. Segundo os estudos organizados por CAMARGO et. al. (2002), ao contrário do que se previra em 1992, temas essenciais como o do financiamento e o da transferência de tecnologia para o desenvolvimento sustentável ficaram sem resposta, e até mesmo agravaram-se, aumentando as tensões políticas entre os países economicamente desenvolvidos e os países em desenvolvimento.

 

De acordo com estes autores, os quais chamam a atenção para a forma de análise das ações realizadas neste período pode-se dizer que para isso, 

“devemos avaliar criticamente as tendências globais, mas também identificar o que avançou e o que resta por avançar no Brasil da última década. Mesmo tomando-se em consideração as graves limitações da economia brasileira e as restrições fiscais e orçamentárias que acompanharam o período, precisamos considerar as resistências institucionais e os fatores que inibiram os passos desejados para, daqui para frente, remover os obstáculos e recuperar o terreno perdido” (2000, p. 18). 

Assim, pode-se dizer que nesse período, imperou uma estratégia de governo fundamentada na inserção do Brasil na economia mundial, em processo acelerada de globalização, através da quebra de barreiras comerciais e da circulação de capitais, privatizações e abertura da economia para o capital externo. O esforço básico da diplomacia e das relações internacionais foi para criar e manter a imagem de um país estável, atento às agendas e demandas multilaterais, de modo a remover obstáculos legais, políticos ou até simbólicos que pudesses afugentar investimentos ou capitais de ocasião.

 

Foi neste contexto que questões relacionadas ao meio ambiente, aos índios e populações tradicionais, aos conflitos fundiários ou aos direitos humanos foram incorporadas à estratégia política do governo federal. A ênfase nestas políticas, no entanto, ficou limitada à sua função simbólica, ao seu eventual possível impacto de mídia, sem que se tenha estabelecido uma agenda consistente de ações dirigidas à efetiva solução do desenvolvimento sustentável, dependente de reformas profundas nas estruturas de governo, da sociedade e da cultura.

 

Dessa forma, apesar de alguns avanços localizados e importantes, não se alcançou o patamar de políticas afirmativas que pudessem contribuir para reverter os altos níveis de pobreza, de devastação ambiental ou fragilidade dos poderes públicos, responsáveis pelo controle e fiscalização das ações da degradação ambiental do país. 

            Entretanto, CAMARGO et. al. (2002), ressaltam que no período de 1992-2002, houve avanços significativos no arcabouço legal do país e na consciência da população brasileira sobre a importância do meio ambiente e o reconhecimento dos direitos das populações tradicionais. A participação da sociedade civil nas decisões governamentais também cresceu de forma consistente, embora haja uma inquestionável crise de governança e de fragilização dos meios de implementação.

            CAMARGO et.al., organizadores do livro Meio ambiente Brasil – avanços e obstáculos pós-Rio-92, fazem a avaliação de como evoluiram os indicadores sobre oito temas centrais para o desenvolvimento sustentável no Brasil – biomas, agricultura, biodiversidade, recursos hídricos, energia, cidades, consumo e responsabilidade social das empresas, contribuindo sobremaneira para uma análise mais apurada da questão.

            Em relação à energia declaram que: 

“A matriz energética no Brasil costuma ser caracterizada de maneira geral como limpa. Por um lado, em termos de quantidade usada de energia, o consumo per capita ainda é relativamente baixo, sendo de 1,13 TEP (toneladas equivalentes de petróleo) por habitante, enquanto nos países da OECD este consumo chega a 5,5 TEP por habitante ao ano. Em termos de eficiência econômica na emissão de carbono, o também se destaca positivamente. O país gerava, em 1995, 0,33 quilos de CO2  por dólar do Produto Interno Bruto (PIB), em comparação com os americanos que chegam a 0,85 KgCO2 / US$90’ a União Européia a 0,51 KgCO2/US$90 e a China a 0,92 KgCO2/US$90 “ (2002, p.30).

             Para eles isso se deve principalmente ao peso da energia renovável na matriz brasileira, destacando-se a energia hidrelétrica e o uso de biomassa para fins energéticos. Enquanto os combustíveis fósseis representam 58% do consumo de energia no Brasil, nos países da OECD eles representam 81%.

            Contudo, as tendências nos últimos dez anos apontam para a falta de planejamento adequado do setor energético e a adoção de políticas regulatórias improvisadas. Como exemplo, podem ser citados o recente racionamento energético e a escassez de investimentos.

            De acordo com os estudos realizados por CAMARGO et al., afirmam que:           

“Também a contribuição das energias renováveis vem caindo na matriz brasileira. Elas eram 47,2% da matriz em 1992, e em 2000 representavam 39,4%. As estimativas de planejamento, no plano plurianual de energia de 1997, de crescimento da oferta de energia elétrica até 2009 indicam que a geração por termelétricas a gás natural, carvão e nuclear vai triplicar, fazendo com que estas energias cheguem a representar 20% da matriz brasileira, enquanto a geração por energias alternativas vai contribuir com somente 0,3% da capacidade geradora” (2002, p.31). 

            O modelo de grandes hidrelétricas com impactos sócio-ambientais significativos parece que tem se esgotado e cada vez mais se buscam alternativas em combustíveis fósseis para a geração de eletricidade, ao invés do desenvolvimento de alternativas renováveis de menor impacto como as pequenas centrais elétricas, biomassa, energia solar e eólica.

            Entretanto, a hidreletricidade ainda é a alternativa mais viável, devido à própria vocação do País expressa no seu potencial hidro-energético de 260 GW, dos quais apenas 25% estão sendo utilizados. Porém deste total, 10% estão localizados na região Nordeste e 44% na região Norte, tornando necessárias linhas de transmissão de longa distância. Ademais, o aproveitamento da hidreletricidade confronta-se com o dilema histórico das usinas, cujos benefícios não são os mesmos que sofrem as suas externalidades. Além de o custo de reassentamento das populações afetadas variar bastante, a estimativa dos aspectos sobre biodiversidade é complexa. Finalmente, as emissões de gases que contribuem para o efeito estufa de hidrelétricas, embora relativamente reduzidas, também não são nulas (ROSA et al. 1996).

            Segundo GOMIDE (2002), a energia hidráulica é a base da geração elétrica no Brasil e o grande potencial para sustentar o crescimento do consumo ainda por muitos anos. Limpa e renovável, a hidreletricidade vem enfrentando, para o seu desenvolvimento, resistências mais emocionais do que racionais. Em verdade, ela gera mais desenvolvimento do que problemas sócio-econômicos. O reassentamento populacional – feito com critério e supervisão – melhora as condições de vida das populações realocadas, traz ao conhecimento sítios arqueológicos e propicia a preservação deste conhecimento, permite para a detecção de nichos ecológicos e sua conservação, contribui para o enriquecimento de bancos genéticos, proporciona um melhor conhecimento da fauna e flora em seus ecossistemas, para não falar nas possibilidades criadas pelo uso múltiplo da água. Portanto, deve continuar sendo o sustentáculo das necessidades de consumo de energia elétrica e, mediante o pagamento pelo uso da água, torna-se importante instrumento econômico, inclusive para se atingir a competitividade de outras fontes renováveis de energia.

             O que não se pode perder de vista são as questões sociais que envolvem o modelo de energia hidrelétrica existente no Brasil, bem como os atingidos por barragens, para isso TRERVEILER et al. (2002), declaram que:                       

“Entendemos que sustentável é um modelo em que as necessidades básicas de todo o povo sejam plenamente atendidas (emprego, comida, saúde, educação, terra, moradia, lazer, etc.). Nele o ser humano é o centro de todas as preocupações e, de maneira informada, decidirá o futuro com responsabilidade. No caso do modelo de produção de energia, fica clara a opção por aquele que gera mais lucro aos grandes grupos econômicos, ao invés de optar pelo que causaria menos problemas ambientais e sociais ou ainda que pudesse colocar a energia produzida à disposição de todo o povo” (2002, p. 328).

  

            Diante disso, podemos afirmar que neste início de século, ainda encontramos um modelo que ainda se mostra hegemonicamente insustentável, gerando impactos sócio-ambientais significativos e sem dúvida nenhuma a questão energética está no centro dessa crise ambiental mundial.

            O século XX foi marcado pela era dos combustíveis fósseis, principalmente pelo petróleo que, mesmo trazendo os benefícios que a tecnologia proporciona para o desenvolvimento da humanidade, gera também conseqüências sérias na esfera global, como as mudanças climáticas, e na esfera local, com os acidentes e vazamentos que provocam contaminação ambiental e impacto na saúde humana. Torna-se emergente uma mudança substancial no modelo energético vigente.

            Para CUNHA, representante das ONGs, (2002), na Rio-92, a questão energética foi tratada superficialmente. Na Conferência das Nações Unidas foi assinado um protocolo apenas sobre mudanças climáticas, que tem sido o principal tema tratado nas conferências posteriores, devido à sua relevância. Em 1992, as ONGs e movimentos sociais elaboram e aprovaram vários tratados, visando pôr em prática uma série de ações na esperança de alcançar um futuro sustentável.

            CUNHA manifesta que o tratado de energia define as decisões sobre produção, distribuição e uso de energia devem ser tomados obedecendo aos seguintes princípios, validos até hoje:

·         “Princípio ético: A energia deve ser produzida, distribuída e usada com o máximo de eficiência e o mínimo de impacto sobre o bem-estar das pessoas e da natureza. Os custos ambientais e sociais devem ser contabilizados.

·         Principio da eqüidade: Todos os povos, comunidades e nações têm direito a igual acesso aos bens e serviços proporcionados pela energia. Isso implica distribuição eqüitativa em todos os níveis e mudanças de estilos de vida perdulários.

·         Princípio da tomada de decisão: As decisões devem ser democráticas e participativas. Toda a informação acerca de um empreendimento deve ser claramente apresentada e publicamente discutida” (2002, p. 332).

 

            O atendimento a esses princípios ainda é uma meta a ser atingida. O que tem presenciado no Brasil são decisões tomadas sem consultas amplas, apenas para cumprir o ritual do licenciamento ambiental. Algumas vezes é possível interferir, mas, na maioria das vezes, trabalha-se com o fato consumado.

            Outro aspecto a ser abordado aqui é a responsabilidade da política energética, tradicionalmente é do Estado, tanto no controle das fontes (petróleo, gás, água, urânio) quanto no papel regulador, através do estabelecimento de normas, preços e tarifas.

            Ultimamente esse papel está sendo alterado com o processo de privatização do setor elétrico e as mudanças no monopólio do petróleo, permitindo a entrada de grandes capitais privados, principalmente estrangeiros, no controle da extração, geração e distribuição de energia, o que tem sido objeto de várias avaliações e críticas. O papel regulador permanece, mas o estabelecimento de normas e procedimentos não tem acompanhado adequadamente a reforma do Estado, ficando atrelado aos interesses e urgências do capital transnacional.

            Para os ambientalistas, a recente crise energética que o País sofreu em 2001, com o racionamento no setor elétrico, é uma prova disso. As causas que levaram a esta situação não podem ser simplesmente atribuídas à falta de chuva, mas fundamentalmente à má gestão das bacias hidrográficas w à falta de investimento no setor. A população respondeu de forma muito positiva ao chamado do governo para economizar energia. Com o término do racionamento, todo esse esforço deveria ter continuidade, para que o uso da energia continuasse sendo feito de forma a gerar conservação e eficiência energética. Mas infelizmente o governo não está aproveitando essa consciência para manter vivo no espírito dos cidadãos um dos princípios citados anteriormente, o da ética, “uso da energia com o máximo de eficiência”.

            Ainda para CUNHA (2002), se faz necessário, urgentemente, estabelecer uma nova política energética sustentável, como prioridade nacional. Esta nova política deve estar em concordância com o modelo de desenvolvimento que seja democrático, social e ambientalmente sustentável. Deve atender às demandas do desenvolvimento econômico, mas também às demandas sociais básicas, secularmente desrespeitadas.

            Para viabilizar um novo padrão energético, este autor elencou algumas ações que devem ser priorizadas visando atender as necessidades energéticas do Brasil de forma sustentável.

·         “Cumprir os princípios estabelecidos no tratado das ONGs assinado na Rio-92.

·         Estabelecer novos padrões de consumo menos intensivos em energia, enfatizando a reciclagem e a reutilização de materiais.

·         Implementar programas de conservação e eficiência energética em todos os setores, em especial naqueles mais consumidores de energia, como transporte e indústria, e junto à população em geral.

·         Buscar novos materiais e processos tecnológicos menos intensivos em energia.

·         Repensar o modelo de transporte brasileiro (urbano e interestadual), garantindo um sistema intermodal integral, incentivando o uso de fontes renováveis de energia e o transporte coletivo.

·         Estabelecer um programa de redução do uso de combustíveis fósseis e de incentivo ao desenvolvimento de combustíveis renováveis (álcool e biodiesel).

·         Rever a metodologia de aproveitamento do potencial hidrelétrico brasileiro, que permita a participação social no processo decisório, em especial das populações atingidas.

·         Estabelecer a moratória do Programa Nuclear Brasileiro, desde a mineração do urânio até a geração nuclear, devido ao alto risco ambiental e de segurança das populações.

·         Aumentar a utilização do gás natural na Matriz Energética com os cuidados sócio-ambientais que minimizem seus impactos.

·         Incentivar o plantio de bosques energéticos para viabilizar o uso de lenha e carvão vegetal de forma sustentável, eliminando a pressão sobre a floresta nativa.

·         Incentivar o aproveitamento dos resíduos da biomassa, como o bagaço de cana, para a produção de energia elétrica e a co-geração (energia a vapor).

·         Implementar um programa de aproveitamento do imenso potencial das energias solar e eólica, com o incentivo à instalação efetiva de painéis fotovoltaicos, coletores térmicos solares e cata-ventos.

·         Auditoria nas instalações energéticas com potencial de impacto ambiental, em especial naquelas que têm gerado passivo ambiental (petróleo, carvão mineral, ciclo nuclear, usinas termoelétricas e hidrelétricas) (p.334) “.

 

 

Renato Cunha conclui enfatizando que essas medidas devem ser viabilizadas por meio de um amplo debate com a sociedade brasileira e associadas a uma revisão institucional do planejamento e da gestão energética, com uma definição clara do papel do Estado, com o fortalecimento de seu papel de fomento e regulação, garantindo a participação e o controle social.

 

CAPÍTULO IV

 

REGIÃO ONDE O ESTUDO FOI REALIZADO

 4.1 - Caracterização da Região

A área de estudo encontra-se no Estado de Minas Gerais, numa posição estratégica como caminho de passagem entre São Paulo e o Planalto Central. A cidade de Uberlândia, durante muitas décadas, exerceu a sua vocação natural de grande entreposto comercial da região, trazendo produtos manufaturados de São Paulo e abastecendo Goiás, Mato Grosso e o Pontal do Triângulo Mineiro.

 

A atividade comercial exerceu papel preponderante na evolução econômica do município até a década de 40, estimulando o desenvolvimento da atividade agrícola (cujos produtos principais eram o arroz, cana-de-açúcar, milho e feijão) e da pecuária bovina.

 

Nos anos 60, Uberlândia fortaleceu-se como o grande centro de comercialização de uma região maior, ampliada pela construção de Brasília. Seu comércio, já estruturado, beneficiou-se da grande corrida para o Oeste, pois a sua localização estratégica permitiu-lhe participar intensamente do processo de interiorização do desenvolvimento, característico do período.

 

A industrialização se intensificou a partir da primeira metade da década de 70, tanto ao nível de Estado quanto da região analisada. Aproveitando-se das oportunidades criadas pelo processo de descentralização industrial de São Paulo, o governo estadual definiu os instrumentos fiscais e creditícios destinados a atrair investimentos para Minas Gerais.

 

Paralelamente, ocorreu a incorporação dos cerrados á exploração agrícola produtiva. A macrorregião do Triângulo Mineiro e Alto Paranaíba, pela sua adequada estrutura fundiária, topografia favorável, localização estratégica em relação aos principais centros urbanos do país e relativos avanço da infra-estrutura urbana em alguns de seus municípios, foi eleita pelo I Plano Mineiro de Desenvolvimento Econômico e Social (1971/75) como uma das regiões mais adequadas para concentrar esforços no sentido de desenvolver uma agroindústria em bases modernas, capaz de contribuir não apenas para o atendimento do mercado interno, como também para a geração de excedentes exportáveis.

 

A região recebeu significativas aplicações de recursos com a implementação de programas como Programa de Desenvolvimento dos Cerrados (POLOCENTRO), o Programa de Assentamento Dirigido do Alto Paranaíba (PADAP) e Programa Nipo-Brasileiro de Desenvolvimento Agrícola da Região dos Cerrados (PRODECER).

 

Esses projetos apresentaram como característica básica à modernização da atividade agrícola, com a utilização de grandes extensões contínuas de terra; uso intensivo de capital; inovações tecnológicas; e mudanças na pauta produtiva com introdução de culturas voltadas para exportação, principalmente soja e café.

 

Paralelamente, foram destinados recursos para a formação de uma infra-estrutura econômica condizente com o processo de ocupação dos cerrados. Assim, expandiu-se a malha viária, ampliaram-se a capacidade de armazenamento e a distribuição de energia elétrica. Há que se ressaltar, que a referida modernização ocorreu nas áreas de cerrado, localizadas nas regiões de chapadas dos municípios. Entretanto, nas áreas próximas ao rio Araguari, onde o relevo é acidentado e encaixado, e ocorrem pequenas várzeas mais próximas ao rio, continuam a predominar as atividades tradicionais, quais sejam, a pecuária, tanto de corte como de leite, e a agricultura de subsistência.

 

A localização estratégica de Uberlândia, o nível de desenvolvimento da cidade e as facilidades de transporte reuniram condições favoráveis para concentrar neste município o beneficiamento e a transformação de parcela significativa da produção agrícola do Alto Paranaíba, de parte do Noroeste Mineiro e de parcela da produção do Pontal do Triângulo Mineiro não comercializada com São Paulo.

 

Do ponto de vista da dinâmica populacional, nas últimas décadas, a Área de Influência apresenta como característica básica um ritmo médio de expansão da população em níveis superiores ao do estado, com concentração da população na sede dos municípios, evidenciando um esvaziamento da área rural.

 

As análises indicam que a população que morava em áreas rurais, ao longo do tempo, vem se deslocando para as áreas urbanas. O grande êxodo ocorrido a partir da década de 1970 justifica-se em função de diversos fatores, que se associam tanto à formalização do trabalho rural, como pela procura de melhor qualidade de vida nas áreas urbanas. De acordo com as informações anteriores, os índices de urbanização regional e das cidades da AI de Capim Branco I e Capim Branco II já correspondem aos dos grandes centros brasileiros.

  

A distribuição da população do município de Uberlândia é o aspecto principal das diferenciações sócio-espaciais da Área de Influência (AI), cuja característica é a maioria da população já residindo na cidade. Uberlândia já não é mais uma cidade média e sua dinâmica econômica já não se apresenta apenas como região e pólo agrícola e agroindustrial.

 

Segundo os dados do Censo 2000, o município atingiu 500.095 habitantes sendo que 487.887 (97,6%) residiam na área urbana e apenas 12.208 (2,4%) pessoas viviam na área rural.

 

A realidade de Araguari não é muito diferente quanto ao aspecto demográfico. Segundo os dados do Censo Demográfico de 2000, a população total chegou a 101.519 habitantes, sendo que 92.389 (91%) pessoas residiam na área urbana e apenas 9.130 (9%) no meio rural.

 

A cidade de Uberlândia não tem mantido um ritmo de elevação da oferta de emprego urbano característico da década de 80 e início dos anos 90, tanto para absorver o crescimento natural da população quanto dos migrantes que chegam a procura de trabalho. Diferentemente da situação diagnosticada na fase dos estudos de viabilidade ambiental, atualmente o conjunto de municípios, mesmo os de pequeno porte da região, já registram índices de desemprego semelhantes à média de algumas regiões metropolitanas.

 

É importante destacar que o emprego é uma variável difícil de ser avaliado, devido tanto às informações estatísticas disponíveis em nível regional/local quanto às alterações contínuas no mercado de trabalho, pelo seu dinamismo, em geral associado à velocidade e “qualidade” das adaptações a mudanças conjunturais que provocam constantes desequilíbrios. Mesmo assim, o “nível de emprego urbano” deve ser considerado como um importante dado para medir a qualidade ambiental na região.

 

Há que se destacar que o crescimento de bairros populares e assentamentos urbanos irregulares nas grandes cidades como Uberlândia, traz implicações diretas nas áreas adjacentes à futura represa de Capim Branco, com aumento da demanda por emprego e serviços na área de construção do aproveitamento hidrelétrico de Capim Branco.

 

Além da concentração demográfica, a Área de Influência apresenta outro fator, que está contribuindo para a redução do número de estabelecimentos de ensino situados na zona rural, a chamada “nucleação de ensino”. As prefeituras vêm adotando a concentração da infra-estrutura educacional, em pontos estratégicos dentro do município e utilizam o transporte escolar para buscar e levar o aluno da casa até a escola, e vice-versa. A população estudantil da área rural é levada para escolas situadas em pólos educacionais. Este modelo permite, até mesmo, a oferta de um ensino melhor, pois muitas vezes subutilizadas, as escolas rurais são mais precárias e têm custos maiores que as urbanas.

 

Com relação à demanda por habitação, tanto Araguari quanto Uberlândia, segundo informações das prefeituras e de algumas imobiliárias locais, há problemas de atendimento à população de menor poder aquisitivo, pois é pequena a oferta de imóveis para a faixa de renda de até três salários mínimos. As duas sedes contam com programas habitacionais em implantação pelo poder púbico. Em Uberlândia, o déficit habitacional corresponde a 2,7% do total da população e em Araguari a 3% (EIA/1996).

 

No setor de saúde, os municípios de Araguari e Uberlândia pertencem à Delegacia Regional de Saúde de Uberlândia, composta de 18 municípios, entre os quais incluem-se, ainda, Nova Ponte e Indianópolis. Cumpre destacar a importância de Uberlândia, enquanto pólo regional. Este município conta com um complexo sistema de saúde servindo de referência para os demais municípios da região.

 

No contexto da Área de Influência foram abordadas as condições de saneamento básico dos municípios de Araguari e Uberlândia. Conforme definido na metodologia do Plano Diretor do empreendimento, é também considerada, na abrangência da AI, a bacia de contribuição dos reservatórios, sendo analisadas as fontes de poluição e caracterizadas as condições de saneamento básico dos distritos e povoados aí situados.

 

Em análise geral, pode-se citar que parcela representativa das populações urbanas residentes em Araguari e Uberlândia encontra-se com atendimento de infra-estrutura de saneamento de forma satisfatória, se comparado com parâmetros regionais, com os seus sistemas de abastecimento d’água, esgotamento sanitário e limpeza urbana em fase intermediária de melhoria dos seus serviços, onde via de regra as maiores carências encontra-se nos aglomerados mais carentes (favelas e bairros populares).

 

Nos distritos e povoados, são encontrados estágios distintos de atendimento, com a percepção de níveis mais baixos na quantidade e qualidade dos serviços prestados. Visto que nestas localidades o tipo de ocupação do solo e adensamento permite adoção de iniciativas isoladas, o problema torna-se menos crítico, se comparado com áreas urbanas carentes.

 

A infra-estrutura existente na Área de Influência do AHE Capim Branco I e II estão diretamente relacionada às atividades produtivas e aos níveis destas nos municípios de Araguari e Uberlândia. Foi constatada uma boa disponibilidade de infra-estrutura física em todos os aspectos analisados, quais sejam, meios de Transporte, Telecomunicações e Energia.

 

A Área de Influência possui rodovias importantes, tanto no sentido norte-sul, quanto leste-oeste, sendo as principais: BR 365, que realiza a ligação entre Itumbiara, Uberlândia, Patrocínio, Pirapora e Montes Claros; Araxá é a MG 223, que liga Araguari a Goiânia. Nos limites da AI, encontra-se também a ferrovia RFFSA/SR2 de sentido leste-oeste, que liga Goiânia e o Distrito Federal à RMBH.

 

De acordo com referências do Banco de Dados Integrado da Prefeitura Municipal de Uberlândia, apresentam como principais produtos originários do Triângulo Mineiro e transportados através das linhas da FEPASA e RFFSA: a soja, o farelo de soja e o milho. Com relação aos produtos com destino ao Triângulo Mineiro, tem-se como principais: adubos, combustíveis e cimento.

 

O transporte aeroviário de cargas e passageiro é sustentado por um aeroporto com pista asfaltada medindo 1900 x 45m, com vôos nacionais, regionais regulares e fretamentos operados pela TAM, VARIG, Brasil Central, Rio-Sul e empresas de táxi aéreo, em Uberlândia. Há, ainda, dois aeroportos situados em Araguari, um com pista asfaltada medindo 1500 x 30m, e outro privado com pista de cascalho medindo 1100 x 30m.

  

No contexto das atividades econômicas, há que se considerar também as atividades minerarias que, na Área de Influência, estão relacionadas aos materiais de emprego imediato na construção civil. Destacam-se as extrações de areia e de argila, ao longo do rio Araguari.

 

Do ponto de vista de mercado são diversos os fatores que influenciam a relação demanda x oferta de areia em um município, entre os quais destacam-se: consumo da população, investimentos do setor empresarial da construção civil, obras públicas, crescimento econômico e emprego. Os principais setores que demandam areia são as grandes empresas produtoras de concreto, os pequenos consumidores e empresas que fabricam concreto de asfalto.

 

 4.2 - Caracterização da Área de Estudo

 

A Usina Hidrelétrica Capim Branco I e a Usina Hidrelétrica Capim Branco II serão as usinas que comporão o Complexo Hidrelétrico Capim Branco (registrados nos mapas que compõem o Anexo II), a ser construído no Rio Araguari, no Estado de Minas Gerais, próximo às cidades de Uberlândia e Araguari, e estará compreendido no trecho do rio que se estende entre a UHE de Miranda e a UHE de Itumbiara.

 

Os Aproveitamentos Hidrelétricos de Capim Branco I e Capim Branco II estão localizados na bacia do rio Araguari, situada na bacia do Alto rio Paranaíba. Terão potência de 240 e 210 MW respectivamente. Eles serão implantados por um consórcio composto pela Cemig, Cemig Capim Branco Energia S. A., Companhia Vale do Rio Doce, Comercial e Agrícola Paineiras Ltda e Companhia Mineira de Metais. A participação da Cemig é de 21%. As obras de Capim Branco I estavam previstas para iniciar em 2002, o que não aconteceu, e a geração comercial está prevista para fevereiro de 2005. Capim Branco II deverá ser iniciada em 2003 e a geração comercial está prevista para julho de 2005.


CAPÍTULO V

MÉTODO 

Este capítulo descreve as questões relacionadas à coleta de dados a partir da população, dos critérios utilizados para a seleção da amostra, da escolha, da construção e da aplicação dos instrumentos, bem como das análises a que seriam submetidos os dados colhidos.

 

De acordo com os propósitos estabelecidos neste trabalho, e tendo em vista a necessidade de obter informações a partir de diferentes ângulos, foram desenvolvidos dois estudos. O Estudo 1 visava pesquisar,  através da mídia impressa, os aspectos geradores de preocupações atribuídos pelos diferentes segmentos da sociedade de Uberlândia a respeito da construção das hidrelétricas Capim Branco I e Capim Branco II. Para isso, durante todo o ano de 2002, foram selecionados os jornais locais que traziam assuntos enfocando tais aspectos, o que possibilitou analisar como o homem deixa de ser uma preocupação social dentro do contexto pesquisado. Para compor o Estudo 2, elaborou-se uma entrevista (ANEXO I) a qual trabalhou questões abertas e fechadas com a finalidade de coletar os dados que atendessem as exigências do presente trabalho. Para tanto, esta foi aplicada aos proprietários rurais que terão suas terras inundadas pelos lagos das represas e, tinha como objetivo verificar as expectativas deste homem quando da retirada de seu habitat.

 5.1 - POPULAÇÃO

 Participaram desta pesquisa 26 proprietários de terra da região de Capim Branco, município de Uberlândia – MG, sendo que 08 proprietários terão suas terras ou partes delas inundadas, pelos lagos da Usina Hidrelétrica Capim Branco I e os 18 proprietários restantes, suas terras serão inundadas pelos lagos da Usina Hidrelétrica Capim Branco II. 

5.2 - PROCEDIMENTOS DE SELEÇÃO DA AMOSTRA 

Consideraram-se como critérios para a seleção da amostra do Estudo 1, todas as edições do jornal “O Correio” , publicados durante o ano de 2002, que trouxessem qualquer tipo de publicação referendando o assunto da construção das referidas usinas hidrelétricas, para posterior seleção do conteúdo que tratasse exclusivamente dos aspectos geradores de preocupação e responsabilidade para a sociedade. Definiu-se por este jornal pela qualidade e abrangência em suas publicações.

            Os critérios adotados para seleção da amostra do Estudo 2,  deveriam ser entrevistados somente os proprietários que ainda moravam nas terras da região de Capim Branco, município de Uberlândia – MG, que seriam inundadas pelos lagos das represas das Usinas Hidrelétricas de Capim Branco I e Capim Branco II.

 

5.3 – PERFIL DOS ENTREVISTADOS

             Neste estudo foram objeto da pesquisa 26 proprietários moradores da terra, sendo 25 do sexo masculino e 01 do sexo feminino, cuja idade variava entre 41 a 85 anos e cujo estado civil era solteiro, casado, divorciado ou viúvo. O número de pessoas na família, de 02 a 06. Com relação a escolarização  07 concluíram o ensino fundamental e 10 não, 04 cursaram o ensino médio e 01 não concluiu, 01 concluiu o ensino superior e 03 abandonaram antes de concluí-lo. O tempo de residência era de 03 a 77 anos. A área da propriedade rural variava de 0,4 a 387 hectares. Os proprietários de terra entrevistados desta região empregavam 62 trabalhadores  rurais.          

5.4 - INSTRUMENTO

  Na coleta de dados foram utilizados os seguintes instrumentos: 1) fichamento de  artigos publicados no jornal “O Correio”, da cidade de Uberlândia-MG; 2) entrevistas com proprietários de terra da região do Capim Branco, município de Uberlândia-MG.

 

 Fichamento de Artigos do jornal “O Correio” - Para estes fichamentos realizou-se a seleção dos artigos que abordavam aspectos relacionados com o tema sobre os processos que antecederam a construção das Usinas de Capim Branco I e Capim Branco II, objetivando analisar as preocupações dos diferentes segmentos da sociedade.

 

 Entrevistas com os proprietários e moradores rurais da região de Capim Branco – Esta entrevista foi composta por partes distintas, a primeira destinada à coleta de dados para verificar variáveis situacionais do proprietário rural, como: a) Dados pessoais de identificação; b) Dados sobre o imóvel; c) Exploração econômica. Na segunda parte, objetivando-se identificar as percepções afetivas, bem como as perspectivas do proprietário rural que terá suas terras desapropriadas devido a construção das usinas hidrelétricas Capim Branco I e Capim Branco II, três questões abertas orientaram esta parte da entrevista: a) o significado da terra para o  proprietário rural. b) após o proprietário entregar suas terras onde pretenderia morar. c) a atividade profissional que o proprietário rural pretenderia exercer após entregar as suas terras.

 5.5 - PROCEDIMENTOS DE COLETA DE DADOS

Os dados desta pesquisa foram coletados durante o ano de 2002, através de leituras dos artigos publicados no jornal “O Correio” e as entrevistas foram realizadas no mês de outubro do mesmo ano, por um único pesquisador.

 

Produtores Rurais da Região de Capim Branco

 

Os primeiros contatos foram feitos com o presidente do Sindicato Rural de Uberlândia, para a apresentação do projeto de pesquisa, bem como para obtenção do consentimento para a coleta de dados, uma vez que este presidente mediava os debates, quando da realização de reunião, entre os produtores rurais da região de Capim Branco e o Consórcio Capim Branco I e Capim Branco II.

      

Após este contato, ficou estabelecido que a entrevista aconteceria no mês de outubro. Esta seria feita antes do início da reunião à medida da chegada dos proprietários para não atrapalhar a programação proposta para a reunião.

 

Para a coleta de dados, foram entrevistados 26 produtores rurais, sendo que todas as entrevistas foram realizadas no Sindicato Rural de Uberlândia, na sala que antecede o anfiteatro. O pesquisador procurou conversar a sós com os entrevistados num espaço reservado, durando cada entrevista aproximadamente 10 minutos.

          Neste encontro, o pesquisador procurou colocar os entrevistados à vontade através de uma conversa informal e falou a cada proprietário morador rural dos objetivos científicos de sua pesquisa, garantindo o seu anonimato, caso concordasse em participar, sendo frisada a importância da sua participação e de seus relatos. A seguir, foram coletados os dados que compôs a primeira parte da entrevista como dados pessoais de identificação, dados sobre o imóvel, quantidade de trabalhadores rurais que possuía e exploração econômica. A seguir foi apresentada a segunda parte da entrevista com as seguintes questões sobre o significado da terra para aquele  proprietário rural, a partir do momento que entregasse suas terras onde pretenderia morar e, na sua opinião, qual atividade profissional pretende exercer ao entregar as suas terras, para uma caracterização geral da amostra.

O pesquisador, após ter permissão dos proprietários rurais para registrar suas respostas, anotou seus relatos. As respostas foram anotadas separadamente na folha de registro, apresentada no Anexo I.

 

CAPÍTULO VI

 

RESULTADOS

 

Os resultados apresentados neste capítulo referem-se aos dados obtidos na aplicação de instrumentos conforme mencionado no item reservado aos procedimentos metodológicos. Sempre que possível, preocupou-se em obedecer à ordem proposta na aplicação destes instrumentos. Foi preservada, também, a ordem dos Estudos 1 e 2 que compõem o presente trabalho.

 6.1 - ESTUDO 1

6.1.1 - DADOS COLETADOS NO JORNAL “O CORREIO”

Os artigos analisados forneceram uma série de informações relevantes para contextualizar o momento histórico, bem como a percepção dos diferentes segmentos da sociedade e os devidos encaminhamentos em relação a construção das Usinas Hidrelétricas de Capim Branco I e Capim Branco II.

 A) - LOCALIZAÇÃO DAS UHE

O complexo de energia Capim Branco contempla a instalação de duas usinas em trecho do rio Araguari, entre os municípios de Araguari/MG e de Uberlândia/MG, que vai do distrito de Martinésia à usina hidrelétrica de Miranda. A Capim Branco I será construída próxima à ponte do Pau Furado. Já a usina de Capim Branco II começará a ser construída seis meses depois do início das obras da Capim Branco I. O complexo está orçado em R$550 milhões e terá potência instalada de 450 Megawatts, suficiente para a produção de 2,5 mil Gigawatts/h de energia por ano. Caso fosse destinada aos consumidores residenciais, a energia poderia atender a um milhão de domicílios.  

 B) - CONSÓRCIO CAPIM BRANCO DE ENERGIA 

Para estabelecer o processo de criação da CEMIG Capim Branco se fez  necessário instituir um consórcio. Por isso cinco empresas  – Companhia Vale do Rio Doce (CVRD), Companhia Energética de Minas Gerais (CEMIG), Companhia Mineira de Metais, Comercial Agrícola Paineiras, Camargo Côrrea Cimentos S. A., formaram o Consórcio Capim Branco Energia (CCBE) que é responsável pela execução de todas as ações inerentes ao processo de construção das respectivas usinas hidrelétricas.

 C) - ÁREA DE ABRANGÊNCIA

As Usinas Hidrelétricas de Capim Branco I e II a serem construídas no rio Araguari, no primeiro levantamento feito pelo consórcio, foram identificados 208 produtores rurais – 58 no município de Araguari e outros 150 na região de Uberlândia. Do total de produtores, apenas 96 serão obrigados a se mudar ou terão a propriedade inviabilizada economicamente. Os demais, ainda segundo representantes do consórcio receberão a indenização relativa apenas à parte inundada pelos lagos. De acordo com informações do consórcio ao jornal “O Correio”, a maioria das propriedades não perderá a capacidade de produção e, por conta disso, receberá ressarcimento relativo somente às perdas parciais provocadas pela desapropriação.

 

Os dados coletados nas publicações, divulgados pelo “Correio”, na região afetada pela construção da UHE Capim Branco I, serão alagados 18,6 quilômetros quadrados, o que representa 1866 hectares. Nessa área foram identificadas 120 propriedades, 100 fazendas e outras 20 ilhas ocupadas irregularmente. No trecho da UHE Capim Branco II, o lago ocupará 44,5 quilômetros quadrados, área equivalente a 3976 hectares. Nesse trecho de terras foram catalogadas 233 propriedades, sendo 208 fazendas e 25 ilhas.

 

Diante deste contexto é que foram analisados os aspectos abordados e divulgados pela imprensa escrita destacando-se as negociações sobre a indenização das áreas onde serão instaladas as UHE; as contrapartidas ambientais; a liminar concedida a uma ação popular contestando a contratação do consórcio responsável pela construção da usina, os impactos que a obra possa causar à região; a construção deverá gerar três mil empregos em Uberlândia e Araguari; e possíveis irregularidades na formação da empresa CEMIG Capim Branco S. A., que é subsidiária da Companhia Energética de Minas Gerais (CEMIG) e integra o consórcio que pretende construir duas usinas hidrelétricas no rio Araguari.

 D) - INDENIZAÇÃO DAS ÁREAS ONDE SERÃO INSTALADAS AS UHE

Tendo em vista os dados coletados, o processo de negociação com produtores rurais de Uberlândia e Araguari seria a última etapa antes do início das obras de construção das hidrelétricas Capim Branco I e Capim Branco II no rio Araguari. Entretanto, os baixos valores das indenizações pagos estavam preocupando os produtores rurais que estavam negociando com representantes da empresa. Percebeu-se que a última negociação, o consórcio pagou R$23 740,86 por uma área de 14,3 hectares – o que equivale a R$1,6 mil por hectare, abaixo do mercado, segundo declarações do advogado do Sindicato Rural de Araguari (SRA), Marcelo Vasconcelos dos Reis, publicação “Correio” do dia 12/10/02. Além disso, afirma o advogado, que o consórcio não está assegurando o pagamento das benfeitorias do “lucro cessante” – que é o valor referente às perdas que o produtor vai acumular com o alagamento da área e a impossibilidade de produção da terra.

 

Outro aspecto coletado neste trabalho foi a publicação, pela Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL), da Resolução 512, em 16 de setembro de 2002, o que somou às preocupações dos produtores, uma vez que esta “declara de utilidade pública, para fins de desapropriação, em favor das empresas integrantes do Consórcio Capim Branco Energia, as áreas de terras necessárias à implantação da UHE Capim Branco”. Segundo a resolução, “as concessionárias ficam autorizadas a promover, com recurso próprio, amigável ou judicialmente, a desapropriação... podendo, inclusive, invocar o caráter de urgência para fins de imissão provisória na posse do bem”.

 

Diante disso, verificou-se que o presidente do Sindicato Rural de Uberlândia, imediatamente reagiu ao declarar que “a impressão que fica é que os representantes do consórcio estão forçando a decisão judicial” e,  disse ainda que o produtor está esquecido e os preços oferecidos são um verdadeiro absurdo.

 

Assim sendo, foi possível perceber, através das publicações, que alguns encaminhamentos foram feitos em relação à negociação das áreas. Um deles foi que os produtores rurais das cidades de Uberlândia e Araguari decidiram, em reunião, criar um grupo de ação chamado de “Movimento dos Afogados”, que será responsável pela negociação junto a direção do consórcio. Outro encaminhamento tomado nesta reunião, é que todas as reuniões e negociações passariam a ser feitas na sede dos sindicatos rurais SRA ou SRU e que seriam acompanhadas por assessores jurídicos, evitando assim reuniões e negociações isoladas. Foi proposto pelo advogado do SRA  que o sindicato a contratação de uma empresa para fazer a avaliação dos imóveis o que possibilitava questionar os valores apresentados pelo consórcio e se fosse preciso recorrer a justiça para que o produtor não fosse prejudicado.

E) - CONTRAPARTIDAS AMBIENTAIS

            Em relação aos dados coletados sobre as negociações de contrapartidas ambientais estas foram feitas entre representantes da Prefeitura Municipal de Uberlândia e o diretor-presidente do Consórcio Capim Branco de Energia, Henrique Di lello Filho, que estiveram paralisadas por dois meses, sendo retomadas no mês de outubro/2002.

 

            Dentre as propostas feitas pela PMU pode-se destacar a construção de um Balneário nas margens do lago da usina Capim Branco I; um jardim botânico na cidade; a instalação de uma das casas de máquinas na margem do rio que pertence à cidade; criação de projetos de educação ambiental; criação de um zoneamento econômico-ecológico e um plano diretor de uso e ocupação da área dos reservatórios; implantação de corredores ecológicos nos afluentes do rio Araguari e, ainda investimentos no setor de piscicultura do Parque Sabiá, estes seriam usados na pesquisa e reprodução de peixes para o repovoamento do rio. Da análise dos dados coletados, não foi possível verificar quais das propostas apresentadas ao Consórcio e que este, de fato, estará de acordo. A construção do Balneário ficou evidente nas declarações ao jornal “O Correio” do diretor-presidente do Consórcio, que não tinha caráter ambiental e, que ainda disse ele, segundo o COPAM, não integra as contrapartidas ambientais.

F) - AÇÃO POPULAR E AÇÃO CIVIL PÚBLICA TENTAM IMPEDIR A CONSTRUÇÃO DAS USINAS DE CAPIM BRANCO I E CAPIM BRANCO II

Os dados coletados apontaram a ação de 34 autores que contestavam o processo de contratação do Consórcio responsável pela construção da usina e questionava ainda os impactos ambientais que a obra poderia causar à região. Aliada a isso, estava a alegação da falta de validade da licença concedida pelo COPAM. De acordo com o artigo publicado “O rio Araguari pertence à bacia Paraná, que não pertence apenas a Minas Gerais, por isso a licença deveria ser concedida pelo IBAMA”. Outra questão que foi levantada na ação foi a concessão por parte do governo federal para que as empresas que compõem o Consórcio Capim Branco tenham o direito de explorar a água do rio Araguari – um bem comum – para fins privados.

 

Dessa forma, as obras que deveriam ter sido iniciadas, encontravam-se embargadas pela liminar concedida pelo juiz federal da 1ª Vara da Subseção Judiciária de Uberlândia, Lincoln Rodrigues de Faria, impedindo o início das obras.

 

Também verificou-se uma ação civil pública impetrada pelos Ministérios Públicos Federal e Estadual de Uberlândia, tentando impedir a construção das Usinas de Capim Branco I e Capim Branco II no rio Araguari. Através destes dados publicados, percebeu-se uma intenção de provar a inviabilidade técnica da obra na região. As alegações dos autores da ação civil pública são parecidas com as relacionadas na ação popular, segundo declarações do procurador da República, Jaime Mitropoulos, citando dois pontos que contrariam a lei. O primeiro é o fato de o parecer final da Federação Estadual do Meio Ambiente (FEAM) favorável à obra ser divergente de um estudo anterior, da própria FEAM, segundo o qual a construção das usinas seria desaconselhável por provocar o fim do último trecho vivo do rio Araguari. Assim, existe uma divergência entre o estudo inicial e o que autorizou a obra. O segundo ponto questionado pelo procurador dizia respeito ao fato de o estudo ter sido feito por um órgão que não era o competente para elaborá-lo, ou seja, o levantamento deveria ter sido encaminhado ao IBAMA e não à FEAM, uma vez que o rio Araguari integra uma bacia hidrográfica que chega até o rio Paraná, logo o levantamento teria que ser feito pelo IBAMA.

 

Nas declarações do procurador da República publicadas no jornal “O Correio”, destacou-se estar convencido de que a construção das usinas traria um prejuízo ambiental incalculável para a região, enfatizando que “eles sequer previram o remanejamento dos peixes daquele rio, no caso da construção, o que é um absurdo”, ao referir-se ao projeto de construção feito pelo consórcio vencedor da concorrência. Ao analisar o texto sobre a fala do procurador observou-se, também a sua preocupação com a ausência de participação da comunidade no processo de discussão sobre os impactos e compensação deles no caso de construção.

 

Assim, até o dia 09 do mês de novembro de 2002, apesar do Consórcio já ter recorrido da ação popular, o recurso ainda não tinha sido julgado pelo tribunal de justiça.

G) - NOVOS EMPREGOS PARA A REGIÃO COM A CONSTRUÇÃO DAS UHE

Mesmo com as obras impedidas foi divulgado pelo jornal “O Correio” do dia 05 de novembro de 2002, que a construção da Usina de Capim Branco deveria gerar, a partir de fevereiro de 2003, três mil novas vagas de emprego em Uberlândia e em Araguari. A seleção do pessoal ficaria a cargo do SINE, como parte do pacto Mineiro pelo Emprego, de acordo com as informações dadas pelo diretor regional da Setascad, Este pacto teve como objetivo inserir novos trabalhadores no mercado de trabalho formal, mediante o aumento no número de vagas oferecido pelo SINE.

H) - INVESTIGAÇÃO NA FORMAÇÃO DA SUBSIDIÁRIA – EMPRESA CEMIG CAPIM BRANCO S.A.

Observou-se nos dados coletados que no dia 12 de dezembro de 2002, mais uma ação popular foi impetrada na Justiça Federal contra o Consórcio Capim Branco. Os autores queriam que a Procuradoria da Justiça Federal apurasse a existência de possíveis irregularidades na formação da empresa CEMIG Capim Branco S. A., que era uma subsidiária da Companhia Energética de Minas Gerais (CEMIG) e que integrava o consórcio que pretendia construir as duas usinas hidrelétricas no rio Araguari.

 

A argumentação usada nessa ação foi que de acordo com a Constituição Federal, inciso XX artigo 37, e Constituição Estadual, artigo 14, a CEMIG só poderia constituir uma empresa subsidiária após a aprovação de um projeto de lei na Assembléia Legislativa de Minas Gerais. Isso porque, de acordo com a advogada que impetrou a ação, “... para a criação de empresa subsidiária, o Estado de Minas Gerais, acionista majoritário da CEMIG, deveria, em obediência ao que dispõe o inciso XX, artigo 37 da Constituição Federal, ter solicitado à Assembléia Legislativa do Estado a autorização para a sua criação e participação em empresa privada”, acrescentou ainda, que “a CEMIG S.A. aparece em atas da companhia como a responsável pelo pagamento de serviços de publicidade e como responsável pelo pagamento de gastos com a contratação de obras e serviços de construção de obras e serviços de construção do complexo”. Dessa forma, houve um pedido a Justiça para que o governo  do Estado e o presidente da CEMIG sejam notificados e que comprovem a existência de leis que tenham sido aprovadas autorizando a criação da subsidiária.

            Entretanto, percebe-se que nas declarações do superintendente da CEMIG, dadas na mesma publicação que não houve nenhuma irregularidade quando garantiu que a constituição da subsidiária seguiu todas as determinações legais, afirmando que a CEMIG pode, através da lei nº 12653 de 1997, criar uma empresa sem que seja necessária a aprovação no Legislativo. A lei complementar que alterou a lei 8655 de 1984 garante que a operadora exerça outras atividades por intermédio de empresa criada pela CEMIG ou empresa que venha a participar, majoritária ou minoritariamente, mediante deliberação do Conselho de Administração. Segundo ele, o processo de criação da CEMIG Capim Branco S. A. foi o mesmo adotado para a criação de outras empresas que possuem participação da operadora.

Portanto, mesmo ainda não tendo parecer da Justiça Federal de Uberlândia para a ação mencionada anteriormente, as obras continuavam paralisadas, ou melhor, sem permissão para o seu início.

 

Diante dos resultados do Estudo 1, verificou-se que o homem continua sendo excluído de qualquer preocupação da sociedade política, jurídica e social, ou seja, não  foi tema contemplado em nenhum tipo de debate e só apareceu quando se discutiu  os problemas relativos à indenização de suas terras.

 

Como forma de ilustração do presente trabalho, cabe lembrar um fato ocorrido quando da formação do lago da barragem de Furnas. Os proprietários rurais que tiveram suas terras inundadas ou parte delas, continuaram a viver na área de entorno explorando uma economia de subsistência básica quase na linha de pobreza, sem a mínima assistência dos órgãos públicos.

 

 Diante disso, detectou-se nas pessoas mais idosas um sintoma de doença apelidada por elas de “doença da cabeça”, que num diagnóstico médico poderia ser avaliado como depressão ou baixa estima, ocasionado pela perda de referências, pelas alterações culturais, pelo choque do poder aquisitivo gerado pelas construções de chácaras de lazer e recreação, onde antes localizavam os seus domicílios e as suas histórias de vida.

 

Este fato vem ao encontro do estudo realizado com os produtores rurais, onde se pode avaliar o impacto social que seria causado pela HE de Capim Branco, sem avaliar as funestas conseqüências psicológicas, sócio-econômicas e os valores culturais da região como, por exemplo, as festas religiosas.

6.2 - ESTUDO 2

6.2.1 - ENTREVISTAS COM OS PROPRIETÁRIOS RURAIS

Os resultados obtidos nas entrevistas com os proprietários rurais que terão suas terras alagadas pelo lago das hidrelétricas a serem construídas na região de Capim Branco forneceram uma série de informações relevantes para contextualizar o proprietário, o tempo de residência no local, a forma de aquisição do imóvel, a área produtiva, o tipo de produção, o significado da terra para ele, o local que pretenderia morar e a atividade que iria exercer após a sua retirada da terra, de modo a ter elementos para analisar os prejuízos que este homem terá além das perdas financeiras, prejuízos em relação às questões sociais e culturais.

Quanto ao tempo de residência no local dos proprietários rurais, os resultados aparecem na Tabela 6.1.

           Tabela 6.1 - Período de residência dos proprietários rurais na região a ser alagadas pelos lagos da UHE*.

Período de residência no local

Número de proprietários

 

%

De 01 a 05 anos

5

19,23

De 06 a 10 anos

7

26,92

De 11 a 15 anos

2

7,69

De 16 a 20 anos

-

-

De 21 a 25 anos

-

-

De 26 a 30 anos

2

7,69

De 31 a 35 anos

2

7,69

Mais de 36 anos

8

30,76

Total

26

99,98

* Dados obtidos a partir da entrevista que se encontra no Anexo I.

Ao analisar o tempo de moradia dos proprietários rurais que terão suas terras alagadas pelos lagos das usinas de Capim Branco I e Capim Branco II, pode-se observar que 53,83% residem no local acima de dez anos, sendo que 30,76% destes residem a mais de 36 anos significando que dos 26 entrevistados, 8 nasceram no local.

 

Em relação a escolarização, 7 cursaram o ensino fundamental completo; 10 não concluíram o ensino fundamental; 4 fizeram o ensino médio e somente 1 não concluiu este; 01 concluiu o ensino superior e 3 não. Assim, conforme a Tabela 6.2, o nível de escolarização é baixo.

Tabela 6.2 - Grau de Escolarização dos proprietários rurais*.

Ensino Fundamental completo

Ensino fundamental incompleto

Ensino Médio completo

Ensino Médio Incompleto

Ensino Superior completo

Ensino superior incompleto

 

Total

7

10

4

1

1

3

26

* Dados obtidos a partir da entrevista que se encontra no Anexo I.           

Ajudando a entender o contexto pesquisado, os dados da Tabela 6.3 apontam que 46,15% dos proprietários adquiriram o imóvel através de herança, o que representa para eles um valor diferenciado do valor comercial, pois nas entrevistas afirmaram que essas terras pertenceram à família já por três gerações, dessa forma, afirmam que “não é possível pensar em dispor de um bem que vem passando de pai para filho”.  

Tabela 6.3 - Forma de aquisição do imóvel pelo proprietário rural*.

Número de proprietários que comprou o imóvel

 

%

Número de proprietários que adquiriu o imóvel por meio de herança

 

%

 

Total

 

%

14

53,84

12

46,15

26

99,99

* Dados obtidos a partir da entrevista que se encontra no Anexo I.

No que se refere a faixa etária, os proprietários rurais apresentam, conforme Tabela 6.4, idades entre 40 a 85 anos, sendo que 53,83% na faixa etária de 40 a 55 anos, encontrando-se na faixa ativa de trabalho, mas sem perspectiva de entrar no mercado de trabalho.  No Brasil as estatísticas também comprovam que a faixa etária acima de 40 anos está marginalizada na competitividade da corrida pelo emprego, inclusive em se tratando do concurso público. No caso dos trabalhadores rurais que terão suas terras alagadas, as oportunidades de ingressar no mercado de trabalho, torna-se ainda mais distante, ocasionado pela baixa escolaridade, sem formação profissional e desconhecimento referenciais urbanos.

Tabela 6.4 - Idade dos proprietários rurais*.

Idade

Número de proprietários

%

De 40 a 45 anos

6

23,07

De 46 a 50 anos

4

15,38

De 51 a 55 anos

4

15,38

De 56 a 60 anos

2

7,69

De 61 a 65 anos

1

3,84

De 66 a 70 anos

3

11,53

De 71 a 75 anos

2

7,69

De 76 a 80 anos

3

11,53

De 81 a 85 anos

1

3,84

Total

26

99,95

* Dados obtidos a partir da entrevista que se encontra no Anexo I.

Os resultados expressos na Tabela 6.5 indicam que todos usam a exploração da terra como meio de sobrevivência, sendo que a produção hortifrutigranjeira, leite e a criação de gado sobressaem entre as demais.

 Tabela 6.5 - Tipo de exploração econômica dos proprietários rurais*.

Tipo de produção

Número de produtores

%

Hortifrutigranjeiro

14

53,84

Leite

10

38,46

Gado de corte

12

46,14

Milho

5

19,30

Comércio de areia

2

7,69

Pastagens

3

11,53

Arroz

4

15,38

Banana

1

3,84

Feijão

1

3,84

* Dados obtidos a partir da entrevista que se encontra no Anexo I.

Ao serem indagados quanto ao significado da terra, os produtores rurais emitiram 26 respostas. Procurou-se aglutiná-las por categorias, mantendo o enunciado dos produtores rurais, na Tabela 6.6.

Tabela 6.6 - Respostas dos proprietários rurais da região de Capim Branco nas categorias sobre o significado da terra para eles*.

Categoria

%

a) Agitação da cidade

7,69

b) Significa tudo na vida

42,30

c) Cultura familiar

7,69

d) Lazer

7,69

e) Berço em que nasceu

3,84

f) Trabalho, meio de vida

30,76

Total

99,97

* Dados obtidos a partir da entrevista que se encontra no Anexo I.

Na Tabela 6.6, verifica-se que as categorias apontadas pelos proprietários rurais expressam o significado das terras para eles: agitação da cidade; significa tudo na vida; cultura familiar; lazer; o berço em que nasceu; trabalho e meio de vida.

 

Os dados da Tabela 6.7 expressam o resultado das respostas dos proprietários rurais sobre suas pretensões de locais de moradia após receber a indenização por suas terras.

Tabela 6.7 – Pretensão de moradia dos proprietários rurais após a indenização de suas terras*.

Local para onde mudaria

%

Cidade

61,53

Mesmo local

23,07

Outra fazenda que iria comprar

7,69

Não sabia

7,69

Total

99,98

* Dados obtidos a partir da entrevista que se encontra no Anexo I.

De acordo com o resultado apresentado na Tabela 6.7, observa-se que 61,53% dos proprietários pretendem mudar para cidade e 7,69% ainda não sabem para onde ir.

 

Solicitados a responder sobre qual tipo de profissão que pretenderiam exercer, os proprietários rurais apresentaram diferentes respostas que foram aglutinadas em categorias conforme Tabela 6.8. Observa-se na categoria a um percentual de 11,53%  que não pretendem exercer nenhuma atividade profissional. Porém, analisando-se o resultado da Tabela 6.4, verifica-se que a faixa etária destes proprietários rurais varia entre 40 a 85 anos o que não lhes garantem muitas opções de trabalho. Na categoria c, apresenta 42,30% dos proprietários rurais vão continuar no trabalho rural, quando indagados responderam que não sabem fazer outra coisa a não ser este tipo de trabalho. Outra categoria que demonstra a insegurança de deixar suas terras para buscar outras opções de trabalho está claramente expressa na categoria e.

Tabela 6.8 - Respostas dos proprietários rurais sobre a atividade que pretendiam exercer*.

Categorias

%

a) Não pretende exercer nenhuma

11,53

b) Comercial

11,53

c) Continuar com o trabalho rural

42,30

d) Quitandeiro

3,84

e) Não sabia dizer

23,07

f) Serviços Gerais

3,84

g) Mecânico

3,84

Total

99,95

* Dados obtidos a partir da entrevista que se encontra no Anexo I.

 CAPÍTULO VII

 

DISCUSSÕES E CONCLUSÕES

 

            A exposição e análise dos resultados deste trabalho, apresentados no capítulo anterior, de acordo com a proposta metodológica desenvolvida, exigiu tratamentos diferenciados para cada um dos estudos. No presente capítulo pretende-se reunir as descobertas subjacentes a cada um dos estudos em questão, para que de forma mais ampla sejam analisados as questões sociais que envolvem um determinado empreendimento, neste caso, específico os proprietários rurais da região de Capim Branco que terão suas terras alagadas pelas usinas hidrelétricas de Capim Branco I e Capim Branco II.

 

Fundamentado no Plano Diretor do Complexo Capim Branco (2002), e nos resultados obtidos através da mídia impressa, percebe-se a falta de preocupação com o homem que hoje reside com sua família e empregados na área a ser alagada sobrevivendo de uma economia rural de subsistência.

 

Observa-se que a proposta de construção das hidrelétricas sob a responsabilidade do Consórcio Capim Branco Energia, tem gerado diversos debates públicos quanto a legalidade da construção do empreendimento, no que tange ao aspecto dos impactos ambientais e sociais que poderá ser gerado, quando da formação do lago.

 

Medidas mitigadoras e compensatórias são propostas e exigidas das partes arroladas, a fim de viabilizar a construção e evitar mais atraso, onerando ainda mais o proprietário rural, tanto emocional quanto financeiro.

 

 No que tange a indenização aos proprietários que terão suas terras inundadas pelo lago, tanto parcial como total foi alvo de declarações do advogado que defende a causa dos proprietários, questionando que o valor indenizatório não premia a questão do lucro cessante.

 

Este posicionamento pelo advogado tem amparo legal, conforme Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002, art. 952. “Havendo usurpação ou esbulho do alheio, além da restituição da coisa, a indenização consistirá em pagar o valor das suas deteriorações e o devido a título de lucros cessantes; faltando a coisa, dever-se-á a reembolsar o seu equivalente ao prejudicado”.

 

“Parágrafo único. Para se restituir o equivalente, quando não existe a própria coisa, a estimar-se-á pelo seu preço ordinário e pelo de afeição, contanto que este não se avantaje àquele”.

 

Outro assunto abordado pela ANEEL – Agência Nacional de Energia Elétrica, vem ilustrar ainda mais os resultados obtidos através da Resolução 512, pois  aumentou ainda mais a preocupação dos envolvidos, uma vez que esta declara de utilidade pública, para fins de desapropriação, em favor das empresas integrantes do Consórcio Capim Branco Energia, autorizando-as a promover, com recurso próprio, amigável ou judicialmente, a desapropriação, podendo, inclusive, invocar o caráter de urgência para fins de emissão do bem.

 

Diante disso, a reação por parte do Sindicato Rural foi imediata, alegando que o consórcio está forçando a decisão judicial. Partindo do pressuposto criou-se o “movimento dos afogados” com o objetivo de reavaliar o valor dos imóveis a serem desapropriados.

 

A decisão tomada pela ANEEL não leva em conta os projetos e medidas propostas no PCA – Programa de Controle Ambiental, que também, devem incorporar aqueles frutos de reivindicações adicionais e ou complementares do órgão licenciador e da comunidade, discutidos no decorrer da primeira fase do processo de licenciamento – Licença Prévia.

 

Outro fator divulgado e que gera controvérsias é a autorização pela ANEEL de exploração econômica no Rio Araguari.  Isto é questionável do ponto de vista jurídico, por ser considerado de utilidade pública, haja vista que o benefício em primeiro momento viabilizará apenas 5 empresas, as mesmas que formam o Consórcio Capim Branco Energia.

 

No presente estudo, verificou-se que, nas contrapartidas ambientais reivindicadas pela Prefeitura Municipal de Uberlândia foram solicitadas diversas propostas como: casa de máquinas do lado esquerdo do rio Araguari, jardim botânico, criação de projetos ambientais e um plano diretor de uso e ocupação da área dos reservatórios. Estas reivindicações foram descartadas pelo diretor-presidente do consórcio, com a seguinte alegação de que o COPAM – Conselho Estadual de Política Ambiental, no seu parecer estabelece que as solicitações não têm caráter ambiental e não integra as contrapartidas ambientais.

 

Veja bem, as solicitações pelo poder público municipal em nenhum momento, refere-se aos “afogados” e na questão de um plano diretor de uso e ocupação dos reservatórios, tem como exemplo os problemas com o Lago do Miranda formado pela UHE de Miranda. A comercialização das áreas ocupadas por imobiliárias chamadas Miranda – 5 na área de entorno do lago não levaram em conta os aspectos e impactos ambientais em completa desobediência as Leis Ambientais. (RESOLUÇÃO CONAMA Nº 237, de 19 de dezembro de 1997 O CONSELHO NACIONAL DO MEIO AMBIENTE - CONAMA, no uso das atribuições e competências que lhe são conferidas pela Lei nº 6.938, de 31 de agosto de 1981, regulamentadas pelo Decreto nº 99.274, de 06 de junho de 1990, e tendo em vista o disposto em seu Regimento Interno). Os proprietários das chácaras acima das localizadas na área de entorno, vivem em completa penúria, inclusive em processo de deterioração social.

 

A Prefeitura Municipal de Uberlândia em atenção aos problemas sociais solicitou ao INCRA/MG – Instituto Brasileiro de Reforma Agrária, a descaracterização de área rural para fins urbanos, impetrado pela Associação Recanto do Miranda 5.

            O INCRA/MG, por sua vez, no seu parecer OF. INCRA/SR. 060/0/MG/nº10/3, fundamentado na Lei 6766 de 19/12/79 Art. 53, deixou claro, que nesta região para ser considerado como área rural, teria que ter no mínimo 2 hectares e no Miranda 5 a área individual demarcada chega apenas a 0,10 hectares. Diante do exposto, transfere para a Prefeitura Municipal de Uberlândia a competência de legalização jurídica, ou seja, a mudança da Lei complementar Municipal 245 de 30 de novembro de 2000 - de Uso e Ocupação do Solo, com aprovação por 2/3 da Câmara Municipal. Caso seja alterada a Lei, a Prefeitura teria que aprovar um projeto urbanístico para Miranda – 5, incluso toda infra-estrutura urbanística e social. Este procedimento torna-se inviável, porque, parte dos bairros de Uberlândia, sofre com o problema de Urbanização. Criado o impasse, não há alternativas em curto prazo para Miranda – 5.  

Segundo GADOTTI (2000), talvez pelo seu uso reducionista e sua trivialização, apesar de aparecer como “politicamente correto” e “moralmente nobre”. Para ele, as críticas ao conceito de desenvolvimento sustentável e à própria idéia de sustentabilidade vêm do fato de que ambientalismo trata separadamente as questões sociais das ambientais. O movimento conservacionista surgiu como uma tentativa elitista dos países ricos no sentido de reservar grandes áreas naturais preservadas para o seu lazer e contemplação.

Com o objetivo de inibir que este fato de Miranda venha a se repetir com a construção das Usinas de Capim Branco e evitar a especulação imobiliária com “chácaras” de lazer na área de entorno, deveria priorizar o homem que terá suas terras alagadas o direito de sua permanência no local, utilizando-se de sua experiência e do conhecimento do local.

Os resultados deste estudo revelam que diversas ações tentam bloquear na justiça a implantação do sistema Capim Branco, questionando-se inclusive a falta de validade da licença concedida pelo COPAM, sobre a dúvida de que o Rio Araguari pertence a Bacia do Rio Paraná e neste caso a licença deverá ser concedida pelo IBAMA. Outra questão levantada foi a concessão pelo governo federal de exploração das água do rio Araguari pelo consórcio para fins privados. Outro fato é o parecer final da Fundação Estadual do Meio Ambiente (FEAM) favorável à obra ser divergente de um estudo anterior, da própria FEAM, segundo o qual a construção das usinas seria desaconselhável por provocar o fim do último trecho vivo do rio Araguari. Outro resultado aponta a investigação na formação da subsidiária da empresa Cemig Capim Branco S.A., demonstra ainda incertezas e questionamentos em relação a sua validade ou não.

Assim sendo, com os diversos enfoques jurídicos e controvérsias, o distanciamento entre o resolver e construir parece estar longe de um desfecho. Dessa forma, as obras que deveriam ter sido iniciadas, encontram-se embargadas pela liminar concedida pelo juiz federal da 1ª Vara da Subseção Judiciária de Uberlândia, Lincoln Rodrigues de Faria, impedindo o início das obras.

Dentre os resultados observados, mostram através de declarações, como a do procurador da República, que “estou convencido de que a construção das usinas traria um prejuízo ambiental e social incalculável para a região”.

 

TORO & WERNECK (1997), já chamam a atenção quando afirmam que mobilizar é convocar vontades para atuar na busca de um propósito comum, sob uma interpretação e um sentido também compartilhado. Para eles a mobilização popular é muitas vezes confundida com manifestações públicas, com a presença de pessoas na praça, passeata, concentração. A mobilização ocorre quando um grupo de pessoas, uma comunidade ou uma sociedade decide e age com um objetivo comum, buscando, cotidianamente, resultados decididos e desejado por todos. Importante, aprender a valorizar o saber social: base da evolução social e cultural.

 

Portanto, a mobilização social poderá reverter um processo já dado como implantado para um processo de reavaliação de determinados conceitos antiquados e ditatoriais. Assim, pode-se perceber que o processo de construção das usinas Capim Branco I e Capim Branco II, pode não acontecer.

 

Outro resultado obtido neste trabalho diz respeito a criação de empregos resultante da construção das UHE de Capim Branco evidenciando que a partir de fevereiro de 2003 serão gerados mais de 3.000 empregos, sendo que a seleção ficará a cargo do SINE como parte do pacto mineiro pelo emprego.

 

Entretanto, é importante salientar que esta mão-de-obra é temporária para 2 ou 3 anos o que beneficiará o comércio de Uberlândia e Araguari, mas, com o término da construção, parte destes empregados poderá fixar residência no entorno destas cidades. De acordo com este trabalho verificou-se que, aproximadamente, 384 proprietários e 288 empregados rurais migrarão para Uberlândia e Araguari onde fixarão residências na área de entorno.

 

Contudo, esta migração ocasionará uma demanda na área de saúde, segurança e poderá elevar ainda mais o déficit habitacional próximo de 3%  ( informações do Plano Diretor das Usinas de Capim Branco I e II) obviamente irá onerar  ainda mais o combalido sistema de saúde e de segurança que já apresenta caótico nos dias de hoje.

 

A fixação do homem no campo, o aproveitamento de sua cultura rural e outros argumentos já enfocados, minimizará o impacto social gerado.

 

Na avaliação do Estudo 1, verificou-se que quase todos os temas foram discutidos: o econômico financeiro, a biodiversidade, os interesses políticos , as falhas apresentadas no Plano Diretor de Capim Branco e  as demandas judiciais, entretanto, o ser humano, ser mais complexo da natureza, foi excluído do processo de discussão.

 

Por isso, os resultados do Estudo 2 possibilitam maior compreensão dos resultados anteriores uma vez que foi possível estar mais próximo do contexto analisado dando assim, condições de uma análise do real às questões sociais que envolvem o proprietário rural, neste momento de incertezas, do sentimento de perder o “tudo” que lhe dá razão para viver.

 

Ao verificar os resultados em relação ao tempo de residência, de idade e da forma de aquisição das terras observa-se que existem aqueles que adquiriram terras já pensando na especulação imobiliária que difere, em muito daqueles que vivem na região desde que nasceram, logo as terras foram recebidas como bens que vêm passando de pais para filhos, chegando já a três gerações e que os proprietários não manifestaram nenhum tipo de interesse em dispor das mesmas, pois para eles estas terras significam muito mais do que apenas um valor econômico.

 

Atualmente, com idade avançada, entre 40 a 85 anos, não podem contar com o mercado de trabalho para absorvê-los em qualquer tipo de atividade ocasionando uma instabilidade de sobrevivência na cidade.

  

 

Acresce-se ainda a falta de escolarização somada a não profissionalização observada nos resultados obtida neste trabalho, portanto, cresce a preocupação em relação aos proprietários rurais que estarão aumentando os números dos “atingidos por barragens” no Brasil. Isso pode significar que não existe uma preocupação em fazer valer o tratado que estabelece o desenvolvimento sustentável, uma vez que sustentabilidade permeia todas as instâncias da vida e da sociedade. Para além da sustentabilidade econômica, deve-se falar da ambiental, social, política, educacional, entre outras. A sustentabilidade deve ser vista a partir dos seus pressupostos éticos e não somente econômicos.

 

De acordo com o Plano Diretor identifica-se que a população rural hoje representa apenas um pequeno percentual em comparação a população de Uberlândia. Dessa forma, não existe neste empreendimento do Complexo de Capim Branco, nenhuma proposta que possa garantir a permanência deste proprietário rural na zona rural, e isso parece não fazer parte das propostas apresentadas até o momento.

 

Os dados revelaram que a exploração das atividades agrícolas levantados prevalece o hortifrutigranjeiro, que são negociados no CEASA e a criação de gado de corte e leite e em menor escala outras atividades de exploração da terra, caracterizando como economia de subsistência em minifúndios.

 

Percebe-se também nos resultados um percentual expressivo, quanto a importância da terra e o trabalho rural como meio de vida, caracterizando-se assim, que simplesmente a indenização por si só, não se dá por encerrado toda uma vida no campo.

 

Pelos resultados, observa-se que mais de cinquoenta por cento dos proprietários rurais passariam a ter como residência a cidade e outros permaneceriam na área rural.

 

Aqueles que migrarão para Uberlândia deverão ter a garantia do direito à moradia, ao saneamento ambiental, à infra-estrutura urbana, ao transporte e aos serviços públicos, ao trabalho e ao lazer, porém sabemos que a implantação do Estatuto da Cidade aprovado pela Lei Federal 10.257, de 10 de julho de 2001, regulamentando a política urbana, devem ser observadas pelos municípios na implementação da política urbana ainda está longe de deixar de ser mais uma lei em vigor para se transformar em ações reais que possam garantir uma cidade sustentável.

 

Por outro lado, a permanência do homem no seu habitat evitará que faça parte daqueles bolsões de miseráveis na cidade e, que possibilite a este continuar produzindo sem prejudicar a produção de hortifrutigranjeiro que hoje é responsável por grande parte do abastecimento do CEASA de Uberlândia e ainda poderá conservar seus valores culturais e sociais construídos ao longo das histórias de suas vidas. Caso deixe de existir projetos que garantam a permanência deste homem com qualidade de vida no seu meio, estes poderão constituir os conhecidos “bóias frias”, passarão a ser mão-de-obra em outras atividades agrícolas exploradas no cerrado, como o café que demanda uma grande mão de obra temporária em que não se exige uma qualificação, mas sim a força de trabalho braçal.

 

Outro aspecto relevante obtido neste trabalho foi o resultado sobre o alto índice de proprietários rurais que responderam, ao serem entrevistados sobre a atividade que pretenderia exercer após a sua retirada de suas terras, que “não sabia dizer”, pois o que eles afirmavam era que só aprenderam a trabalhar com a terra ou com o gado, tirando disso, não sabiam fazer mais nada. Este resultado é preocupante quando se pensa nas exigências legais necessárias para a construção de um determinado empreendimento para que o planejamento seja coerente com o desenvolvimento sustentável, pois concordamos com ALTVATER (1995), quando ele coloca que o desenvolvimento deve ser economicamente eficiente, ecologicamente suportável, politicamente democrático e socialmente justo. Sendo assim, pode-se perceber que o processo de construção das usinas que compõem o Complexo Capim Branco, é totalmente insustentável pelo modelo que tem sido divulgado.

 

Diante disso, observa-se a maior contradição da proposta do desenvolvimento sustentável, pois a organização de estruturas econômicas e sociais coerentes permite ser sustentável apenas de modo condicional – somente enquanto não se colide com as restrições sistêmicas externas, sobretudo o princípio do lucro, a competitividade, a imposição das condições objetivas. A conclusão é simples e realista. Para desenvolver qualquer projeto com sustentabilidade é necessário repensar a economia, esta deverá ser solidária e segundo GADOTTI (2000), a economia deve ser regida pela “compaixão”, aqui entendida na sua concepção etimológica original de “compartilhar sofrimento”. Isso porque, na produção de sua existência, o ser humano divide o peso da dor de forma iníqua: para muitos, a dor e para a minoria, o máximo de prazer e de consumo. O sofrimento precisa ser distribuído mais democraticamente. E isso só se fará pela justiça social, pois lutar por um mundo menos malvado, menos feio e mais justo é uma utopia necessária. Como a utopia do desenvolvimento sustentável é certamente contraditória e parece não servir para grandes coisas, mas ela prestará um bom serviço ao homem, desde já, se o guiar para uma sociedade do futuro na construção da solidariedade.

 

Os resultados apresentados aqui levam a acreditar no mundo humano da riqueza e do poder e o empreendimento, foco deste trabalho, não é diferente dos demais. CAPRA (2002) explicita que grandes segmentos da população são excluídos ou desvalorizados pelas redes globais e se tornam insignificantes do ponto de vista econômico.

    

Assim, resumindo, pode-se notar que, ao verificar os resultados dos Estudos 1 e 2, ambos apontam a exclusão do homem, proprietário rural das terras que serão inundadas pelos lagos das usinas de Capim Branco I e Capim Branco II, do cenário dos debates públicos a não ser quando se discute a problemática da indenização das terras, assunto que, como os demais, não se discute, mas aplica a lei, desvalorizando qualquer valor cultural ou social deste homem, bem como, ignorando as suas condições de vida a posteriori.

         De acordo com os resultados deste estudo pode-se concluir que: 

  • os proprietários rurais que terão suas terras alagadas pelos lagos das usinas de Capim Branco I e Capim Branco II não receberam a atenção devida apesar de figurar no Plano Diretor – PCA;
  • constatou-se que com o processo indenizatório o caso estaria encerrado. Mas, por Uberlândia ser reconhecida como centro Universitário, despertou a atenção como objeto de estudo do impacto ambiental que seria causado quando da formação do lago;
  • o impacto sócio-ambiental não foi alvo de um estudo mais apurado, principalmente pela Prefeitura Municipal, então houve a mobilização social iniciada pelos Sindicatos Rurais Uberlândia/Araguari, a fim de reverter o quadro quanto às indenizações;
  • os produtores rurais da área impactante são responsáveis em grande parte pelo fornecimento de hortifrutigranjeiros ao Ceasa, com cultivo no vale do Rio Araguari.  Parte do desabastecimento desta atividade agrícola ocasionará uma menor oferta e aumento de preços relativo ao custo de transporte por abastecimento por outras regiões;
  • as obras estão suspensas até que o ministério público julgue as liminares das ações impetradas, o que demonstra uma conscientização da população em relação a sustentabilidade ambiental;
  • os proprietários rurais, foco deste trabalho, não possuem idade, nem formação profissional suficiente que atendam as exigências do mercado de trabalho; 
  • o significado das terras para a população pesquisada está vinculada a questões sociais e afetivas o que pode ocasionar uma instabilidade emocional levando-a a não saber o que fazer quando de sua retirada de suas terras.

          A partir de tais conclusões, algumas implicações podem ser levantadas:

  • os graves problemas sócio-ambientais e as críticas ao modelo de desenvolvimento foram gerando na sociedade maior consciência ecológica nas últimas décadas. Embora essa consciência não tenha ainda provocado mudanças significativas no modelo econômico e nos rumos das políticas governamentais, algumas experiências concretas apontam para uma crescente sociedade sustentável em marcha;
  • valorização dos atingidos por barragem oferecendo condições de permanência em seu habitat através de alternativas como:
    • delimitar uma barreira ecológica e criar um banco genético com produção de mudas nativas e o replantio na área de entorno do lago a fim de preservar a cadeia alimentar da fauna ali desenvolvida;
    • capacitar profissionalmente para o turismo rural como processo de educação ambiental, direcionado aos alunos de escolas e despertar nos indivíduos a importância do estudo do bioma da região do cerrado e dos  recursos hídricos;
    • cultivo orgânico, utilização e comercialização de plantas medicinais, aromáticas e condimentares;
    • criação e produção de alevinos da ictiofauna provenientes do rio Araguari;
    • implantação da piscicultura com criação e produção de outras espécies;
    • desenvolver para comercialização a criação da avicultura orgânica do frango e galinha caipira;
    • desenvolvimento de cultivo de hortaliças pelo processo hidropônica;
    • implantação da horticultura e plasticultura;
    • implantar na região um restaurante com comidas típicas da região;
    • formação e treinamento de brigada de incêndio florestal  para atuar na prevenção;
    • criação de minhocas para produção de húmus e também como isca para pesca esportiva no lago da represa;
    • cultivo e processamento de mandioca;
    • implantar o sistema de cooperativa para suporte técnico, jurídico e comercial.

         Os procedimentos de sustentabilidade ao produtor rural a serem alanvacados deverão contar com o apoio técnico e parcerias com diversas entidades, como a criação, implantação e acompanhamento dos projetos:

  • Secretárias Municipais: Educação, Cultura, Assistência Social, Agricultura;
  • Emater – Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural de Minas Gerais;
  • Escolas técnicas e superiores tanto públicas como particulares;
  • Policia Ambiental e Bombeiros Militar;
  • Sindicato Rural;
  • IBAMA – Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis;
  • IGAM – Instituto Mineiro de Gestão das Águas; 
  • Embrapa – Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária.
  • IEF – Instituto Estadual de Florestas.
  • Escola Agrotécnica Federal de Uberlândia

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